Numa sociedade
em que são crescentes os factores de risco para a Natureza, a Constituição da República Portuguesa (doravante, CRP) estabelece um conjunto de princípios fundamentais em matéria de
Ambiente – como sejam o da prevenção, o do desenvolvimento sustentável, o do
aproveitamento racional dos recursos naturais, o do poluidor-pagador – apesar
de ainda se encontrarem numa fase de maturação jurídica alguns deles surgem da
necessidade do seu tratamento e aprofundamento científico ao nível do Direito
do Ambiente.
A consciência
hoje generalizada da escassez dos recursos naturais torna necessário que o
Direito do Ambiente esteja conectado a um princípio de prevenção.
Comummente, os danos ambientais são irreversíveis e
irreparáveis, pois não há como retornar à situação anterior que se apresentava
no momento do dano ambiental. Por outro lado, após a ocorrência, os custos da
reconstituição ambiental são mais onerosos quando comparados com os da
antecipação do dano.
O princípio da prevenção encontra-se referido na al. a) do nº 2 do 66º CRP, assim como na alínea a)
do 3º da Lei de Bases do Ambiente e tem como objectivo evitar lesões do meio ambiente visando
a protecção do mesmo numa lógica de evitar a ocorrência de danos antes da
reparação dos mesmos, o que implica um juízo de prognose (lógica ex ante) quanto às situações
potencialmente perigosas (capacidade de antecipação face a essas situações).
Ainda que a prevenção se possa associar à repressão, o que está em causa num
primeiro momento é a adopção e imposição de medidas destinadas a evitar a
produção de efeitos danosos para o Ambiente e não a reacção a essas eventuais
lesões.
A tendência da Doutrina, nos últimos tempos, tem sido a de restringir o
princípio da prevenção a um conteúdo mais cingido e autonomizar um princípio de
precaução, este de conteúdo mais amplo. Esta tendência, encontra inclusive
expressão legislativa a nível do Tratado Constitutivo da União Europeia no seu
art. 174º nº2.
No entendimento
de VASCO PEREIRA DA SILVA é “preferível à separação entre prevenção e
precaução como princípios distintos e autónomos é a construção de uma noção
ampla de prevenção, adequada a resolver os problemas com que se defronta o
jurista do ambiente.”. O conjunto de razões apresentadas
permite-nos a concordância com a regência da cadeira, ora vejamos:
Em termos linguísticos,
a distinção entre a prevenção e a precaução parece assentar numa diferenciação
aparente, ou seja, uma mera distinção vocabular, pelo que deve-se pensar numa
dimensão que abarca acontecimentos naturais como condutas humanas susceptíveis
de lesar o meio ambiente, sejam elas actuais ou futuras. Seguindo razões de conteúdo material, não faz sentido
distingui-los uma vez que nas sociedades desenvolvidas os factos naturais
muitas vezes são um resultado de determinados comportamentos humanos. Em razão
disso faz sentido avaliar o impacto ambiental tanto a nível natural como humano. Do ponto de
vista jurídico, o princípio da prevenção tem consagração constitucional (art.
66º CRP) com as respectivas consequências o que justifica adoptar uma noção mais
ampla desse princípio constitucional em nome do reforço dos valores e tutela Ambiental.
Daqui
depreendemos que sendo estes princípios complementares, por essas e outras
razões, justifica adoptar um conteúdo mais amplo do princípio da prevenção de
modo a abarcar nela os perigos naturais, os riscos humanos, a previsão das
lesões ambientais ao invés de proceder a autonomização do princípio da
precaução.
Diferentemente, no princípio da precaução em que exige
uma actuação anterior ao princípio da prevenção, pois ele actua antes de os
possíveis impactos danosos acontecerem, incidindo antes da formação do nexo
causal entre o possível efeito do dano com a comprovação científica absoluta da
sua existência, no princípio da prevenção os perigos ao meio ambiente são
concretos e são conhecidas as suas causas e por isso devem ser eliminados ou
minorados. Daí que, o princípio da precaução seja adoptado quando ainda existe
incerteza sobre os efeitos nocivos à saúde humana ou ambiental.
Quanto ao grau de incerteza necessário para accionar a
precaução mesmo que avancemos com uma versão mais estrita de precaução, não se
prescinde de uma razão para crer na superveniência de um efeito lesivo, o que
esbate a linha separatória entre perigo e risco.
Sendo assim, na prática, a prevenção actuaria no
sentido de obstar que uma actividade perigosa viesse a produzir os efeitos
indesejáveis ou seja, procuraria evitar o risco de um dano potencial. Enquanto
que o princípio da precaução actuaria para inibir o risco de perigo potencial,
ou seja, o risco de determinado comportamento ou actividade perigosos
abstractamente.
Assim, no princípio da precaução, o perigo que se quer
prevenir é potencial, enquanto que, no da prevenção o perigo deixa de ser
potencial para passar a ser certo (a actividade é efectivamente perigosa), de
modo que, não se pode procurar a prevenção contra um perigo que deixou de ser
simplesmente potencial mas real e actual. Na prevenção, a configuração do risco
abandona a qualidade de risco de perigo e assume a forma de risco de produção
dos efeitos perigosos.
Cabe, por fim, ter em conta o entendimento de CARLA AMADO GOMES, quando estabelece que a precaução, por irrazoável que é,
deve ser vista como uma vertente do princípio da prevenção, que seria limitada
pelo princípio da proporcionalidade, devendo antes entender-se como uma
prevenção alargada, uma vez que, um princípio deve sempre possuir um
significado jurídico.
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