A ordem jurídica prevê dois mecanismos
de reacção às agressões ao ambiente: o direito penal associado às penas de
prisão e multa e o direito de mera ordenação social através das coimas e
sanções acessórias. Relativamente ao direito civil, este apenas está
direccionado para a indemnização dos danos.
A doutrina tem discutido qual será o
melhor mecanismo a utilizar para esta questão, se criminalizar as condutas, ou
ao invés apenas tratá-las como contra-ordenações.
A defesa do ambiente integra os valores
essenciais comuns da sociedade tendo o estatuto de direito fundamental e
princípio geral. A defesa do ambiente é uma tarefa fundamental do Estado art.
9/d, e CRP, que consubstancia as necessidades da realização da dignidade da
pessoa humana.
Esta necessidade de preservar o bem ambiente
fez surgir mecanismos de tutela do mesmo, nomeadamente através da
criminalização de certas condutas. A grande questão que se tem debatido,
prende-se com a aferição do mecanismo mais eficaz para a defesa deste direito
fundamental, se a via contra-ordenacional se a criminalização.
O direito penal enquanto direito
subsidiário deve constituir a última ratio da intervenção estadual na tutela
dos valores e interesses fundamentais. Este ramo do direito pressupõe a natureza
individual e pessoal da responsabilidade, o que impede a responsabilização das
pessoas colectivas art. 11.ºCP.
A maioria dos danos e perigos para o
ambiente decorrem da actividade de empresas. A única solução seria invocar o
art.12.º, efectivando a responsabilidade dos gerentes e outros responsáveis o
que se torna difícil dada a dificuldade em apurar a responsabilidade individual
no seio das organizações.
Esta dificuldade fez surgir o direito
penal secundário do ambiente DL 28/84 ficando no código penal apenas os crimes
que implicassem perigo de lesão para bens individuais. O direito de mera
ordenação social, enquanto direito administrativo é mais flexível, menos limitado
pelo princípio da tipicidade, mais célere na sua aplicação e está mais perto dos
potenciais infractores, sendo que além disso, prevê a responsabilidade das
pessoas colectivas.
A lei-quadro das contra ordenações de
2006 veio aumentar o valor das coimas que podiam atingir os 2,5 milhões de euros.
Metade das receitas das contra-ordenações deveriam ser reconduzidas para um
Fundo de Intervenção Ambiental, destinadas a reparar danos resultantes das
actividades lesivas do ambiente.
Criou-se assim um direito do ambiente
autónomo de natureza administrativa. Desde 1995 que a nossa legislação penal
consagra dois crimes puramente ecológicos art. 278.º e 279.º CP.
Relativamente à via penal, a doutrina
tem apontado alguns argumentos em seu favor, enquanto outros apontam alguns em
seu desfavor. Como vantagens da adopção deste mecanismo, temos as
seguintes:
1)
A existência de crimes ambientais
confere uma maior dignidade jurídica à defesa do ambiente;
2)
Permite que para além de sanções
pecuniárias sejam também aplicadas penas privativas da liberdade;
3)
O processo penal confere mais garantias
de defesa aos cidadãos, nomeadamente a presunção de inocência (art. 27.º a 32.º
CRP) em compensação das sanções mais severas.
Por seu turno, apresentam-se os seguintes inconvenientes:
1)
Direito do ambiente assenta
essencialmente num princípio de prevenção, ao contrário do direito penal (no
entender de alguns autores) que tem finalidades essencialmente repressivas,
pelo que o direito penal não seria o mecanismo mais indicado para a tutela do
ambiente;
2)
No direito penal, a responsabilidade
pelo crime é imputada individualmente, não podendo a imputação ser sobre uma
pessoa colectiva. Relativamente ao direito do ambiente existem enumeras
situações danosas provocadas pela actuação de pessoas colectivas;
3)
A maior parte dos crimes ambientais resultam
da violação das determinações das autoridades administrativas, pelo que
criminalizando estas desobediências estaríamos a colocar o direito penal numa
posição acessória face à actuação administrativa, dado que o direito penal não
teria uma intervenção autónoma. Deste modo, poderíamos assistir a uma
descaracterização do direito penal, visto que perderia a sua intervenção autónoma;
4)
A criminalização poderia ter o efeito
contraproducente de deixar impunes os agressores do ambiente, devido à
dificuldade em condenar os criminosos.
Relativamente
à via administrativa, verificam-se também algumas vantagens e inconvenientes.
Como vantagens, podem apontar-se as seguintes:
1)
A utilização da via administrativa
confere uma maior agilidade no processo de punição, do agressor do ambiente,
dada a simplicidade do procedimento;
2)
Ao invés do direito penal, a via
administrativa permite a responsabilização das pessoas colectivas;
3)
Não se instrumentalizaria o direito
penal em favor da administração.
Cabe-nos
agora apontar os inconvenientes da adopção da via administrativa como
forma de sancionar os comportamentos lesivos ao ambiente:
1)
Implica uma diminuição das garantias de
defesa dos particulares, apesar de estar salvaguardado o acesso ao recurso;
2)
A não criminalização das condutas
agressoras do ambiente pode ter um efeito de desvalorização das actuações;
3)
O simples pagamento de uma quantia
pecuniária pode não ser suficientemente dissuasora, tendo em conta que o
benefício económico obtido com a conduta pode ser muito superior ao valor a
pagar pela coima.
O
professor Vasco Pereira da Silva [1]defende
que a via mais indicada será um meio termo entre as duas, isto é, devem
criminalizar-se as condutas mais graves, não deixando de ser o meio mais
adequado e privilegiado pelo ordenamento jurídico de reacção aos delitos
ambientais.
O
direito penal do ambiente encontra-se na dependência do direito administrativo.
No fundo trata-se de uma acessoriedade do acto administrativo tendo em conta
que a punibilidade do agente fica na dependência da inobservância das
prescrições e limitações impostas pelos actos administrativos das autoridades
competentes, ao invés de depender da inobservância directa de normas de direito
administrativo[2].
O
nosso ordenamento jurídico consagra crimes ambientais previstos nos artigos
272.º a 282.º CP, tal como várias sanções administrativas, havendo um número
mais elevado destas últimas dispersas por vários diplomas, nomeadamente DL
173/2008 nos seus artigos 32.º, 33.º e 34.º e na lei de bases do ambiente,
artigos 46.º e 47.
Deste
modo, conclui-se que a forma de penalização pelas condutas violadoras do
ambiente não segue forma única, isto é, as condutas ora são objecto de tutela
penal ora de tutela contra-ordenacional. A nosso ver, este regime misto é o que
melhor protege o direito fundamental ao ambiente e ao mesmo tempo respeita o
princípio da subsidiariedade do direito penal face aos demais ramos do direito.
A não adopção por um ou outro dos modelos de tutela apresentados garante uma
harmonia no sistema e uma melhor tutela do ambiente.
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