E da consequente necessidade de intervenção do Estado na protecção do ambiente
A produção de um bem ou serviço ocorre num contexto de interdependência
social, o que torna inevitável a existência de externalidades – spillover
effects – que impedem que o preço de um produto espelhe o custo ou benefício
marginal que representa para a sociedade. Nos casos de externalidades
negativas, o negócio que é vantajoso para dois agentes económicos impõe custos
a um terceiro, o que leva a perdas de eficiência. Entre os vários tipos de
externalidades negativas, talvez as mais evidentes sejam aquelas que provocam
danos no ambiente.
Importante é, como escreve Ronald
Coase, notar que as externalidades apenas podem ser enquadradas numa
relação bilateral. I.e., o poluidor não externaliza verdadeiramente enquanto
não existir um vítima cuja proximidade seja suficiente para constituir um
entrave ao desenvolvimento da actividade, pelo que a própria vítima também
externaliza com a sua presença. O problema que deve ser resolvido é o de saber
se A deve ser autorizado a lesar B ou se deve ser B autorizado a lesar A. A
solução passará, necessariamente, por evitar a maior das lesões.
Ora, a consciência ecológica, manifestada numa dimensão individual e
institucional, tem despertado a atenção para a necessidade de encontrar soluções
de protecção ambiental. A descoberta dessas soluções não pode ficar à margem da
economia. Como é hoje amplamente reconhecido pela doutrina da law and economics
é um erro grave ver o mercado separado da sociedade e desconsiderar as
consequências económicas das decisões jurídicas. A responsabilidade pelo futuro
exige que as decisões sejam economicamente eficientes, satisfazendo da melhor
forma as finalidades, sem desperdiçar recursos, i.e., minimizando os custos e
maximizando os benefícios, procurando um nível adequado de protecção ambiental
ao menor custo.
Regra geral, o equilíbrio de mercado é encontrado na intersecção entre a
curva da oferta e da procura. No entanto, na presença de externalidades, a
curva da oferta das indústrias não irá incluir o custo marginal social, mas
apenas os custos marginais privados, ou seja, aqueles que são directamente
suportados pelos produtores. Porém, a eficiência requer que o custo
marginal social seja igual ao benefício marginal de aumentar a produção.
Consequentemente, as externalidades colocam o nível eficiente de produção num
ponto inferior ao nível de equilíbrio do mercado. No fundo, a produção de bens
e serviços transaccionados no mercado, caso existam externalidades, vai
implicar, para os produtores, um custo menor do que essa produção acarreta para
o todo da sociedade. Assim, se à curva da oferta, que representa o custo
privado, somarmos a externalidade negativa, a curva deslocar-se-á no sentido da
retracção.
Isto significa que a intervenção correctora da falha de mercado deverá
orientar-se no sentido de uma retracção da oferta, o que implicará um
abrandamento de produção e uma subida de preços, de forma a evitar a
sobreprodução de bens que geram externalidades negativas.
Em alguns casos, os mercados privados conseguem lidar com as externalidades
sem a intervenção pública. Partindo da ideia de reciprocidade, Coase associa os problemas de
externalidades a “conflitos de utilização de recursos naturais”, cuja resolução
não deverá passar por uma análise objectiva do valor social de cada actividade
em conflito, raciocínio que seria demasiado complexo. A alternativa será,
então, a internalização das externalidades pelo mercado.
Alcançar o “nível óptimo de poluição” é o objectivo do teorema, já que uma
total eliminação da poluição seria um incomportável entrave à economia. Assim,
deverá ser eliminada a poluição correspondente ao excesso entre as vantagens
socialmente obtidas pelas actividades poluidoras e os prejuízos socialmente
causados pela poluição, i.e., o custo marginal. Ora, o mercado só funcionará de
forma eficiente se não existirem custos de transacção, ou seja, todos aqueles
custos em que se incorre para chegar a um entendimento, baseado na realidade
dos factos e na complexidade jurídica subjacente. Podem ser custos de busca de
oportunidades de troca, custos de determinação dos preços relevantes, identificação
das partes interessadas, custos de negociação, coordenação, etc. Em última
análise, custos de oportunidade.
Adicionalmente, terão de existir direitos de apropriação bem definidos,
porque os “property rights” garantem a reacção espontânea do titular dos
direitos contra as externalidades negativas e facilitam a identificação dos
beneficiários das externalidades positivas. As ideias chave do pensamento de
Coase são, então, a reciprocidade das externalidades, apropriação dos bens
ambientais, identificação dos titulares de direitos e inexistência de custos de
transacção.
Porém, a plena eficiência dos mercados só será atingida, defende o Autor,
caso o Estado não intervenha no seu funcionamento. A intervenção estatal deverá
ser limitada à atribuição de direitos de poluir, de direitos sobre os recursos
naturais que forem de acesso livre, à criação de garantias que protejam os
direitos atribuídos aos agentes económicos, bem como, excepcionalmente, em
casos em que o mercado se revele completamente ineficiente, por serem demasiado
elevados os custos de transacção.
Coase esquece,
na construção do seu teorema, a relevância do factor tempo. Porém, os problemas
ecológicos não se compadecem com um modelo de negociações, de procura de preços
de mercado, tendencialmente sem prazo de conclusão e apenas preocupados com a
racionalidade económica. Falta, portanto, a introdução de uma ética em que o
mercado deve assentar, que tome em conta a durabilidade do desenvolvimento e
consequente sustentabilidade.
Esquece, também, que nem todos os bens naturais são susceptíveis de
apropriação, até porque não podem ser delimitados temporal e espacialmente,
como é o caso do oxigénio, da água ou do carbono. No fundo, o caso dos bens
públicos. Por outro lado, os custos de transacção nunca serão efectivamente
eliminados, pelo que teremos de reconhecer a dificuldade de verificação prática
dos requisitos de uma verdadeira “negociação coseana”, até porque, em última
instância, existe sempre o custo tempo. Acresce que as falhas de informação,
inevitáveis numa negociação em que o que se pretende é a solução economicamente
mais vantajosa, acabarão por resultar em ineficiências no mercado. Todos estes
factores evidenciam, como defende Stiglitz, a necessidade de intervenção
governamental. A intervenção pública passará, portanto,
por duas grandes categorias de soluções: as market-based solutions e as
command-and-control approaches. As soluções baseadas no mercado passarão pela
imposição de impostos pigouvianos, pela atribuição de subsídios no combate à
poluição ou pela criação de um sistema de quotas negociáveis. A regulação
poderá passar por uma imposição de standarts ambientais ou por uma regulação
dos inputs, bem como pela imposição
de cláusulas MTDs.
Fontes Bibliográficas
w Araújo,
Fernando, Introdução à Economia, Coimbra, 2006, p. 541.
w “The problem of social cost”, in Journal
of law and economics - http://www.sfu.ca/~allen/CoaseJLE1960.pdf.
w Silva, Vasco
Pereira da, Verde cor de direito. Lições de direito do ambiente,
Coimbra, 2005
w Oppenheimer,Margaret & Mercuro, Nicholas, Law and
economics: alternative economic approaches to legal and regulatory issues,
USA, 2005
w Stiglitz, Joseph E., Economics of the public sector, London, 2002
w Stiglitz, Joseph E., Economics of the public sector, London, 2002
w Garcia, Maria da Glória, O lugar do direito na protecção do ambiente,
Coimbra, 2007
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