O Crime de ecocídio
O neologismo ecocídio
já está em uso para uma extensão limitada, denotando destruição em larga
escala, no todo ou em parte, de ecossistemas dentro de um dado território. O ecocídio
é, em essência, a própria antítese da vida. Pode ser o resultado de factores
externos, de uma força maior ou um "acto de Deus", como inundações ou
terremotos, ou pode, por outro lado, ser o resultado da intervenção humana.
A actividade económica,
especialmente quando ligada aos recursos naturais, pode ser um factor de
conflito. Pela
sua própria natureza, o ecocídio leva ao esgotamento dos recursos, e onde há um
aumento acentuado de esgotamento de recursos, é certo o surgimento de guerras
pela apropriação desses recursos escassos.
A capacidade do ecocídio de ser
transfronteiriço e multi-jurisdicional traduz-se na necessidade de legislação
de âmbito internacional.
Quando tal destruição surge das
acções da humanidade, o ecocídio pode ser considerado como um crime contra a
paz, um crime contra a paz de todos aqueles que residem nesse dado território
afectado.
Em suma, caso o
ecocídio não seja combatido e possa, desta forma, florescer, o século XXI
tornar-se-á no século das guerras pelos “recursos”.
Para efeitos de direito
internacional, Polly Higgins propõe a seguinte definição para ecocídio:
extensa destruição, dano
ou perda de ecossistema (s) de um dado território, seja por acção humana ou por
outras causas, a tal ponto que o aproveitamento pacífico dos recursos pelos
habitantes desse território seja severamente diminuído.
Existem duas categorias
de ecocídio: ecocídio não-determinável e ecocídio determinável. O
primeiro descreve a consequências, ou potenciais consequências, onde se
verifiquem danos, destruição ou perda para o território em si, mas sem
identificação específica de causa como sendo, ou não, consequência de actividade
humana.
O ecocídio determinável
descreve as consequências, ou potenciais consequências, onde se verifiquem
danos, destruição ou perda para o território, e a responsabilidade
da pessoa ou pessoas jurídicas lesantes
é concretamente determinada.
A
destruição de grandes áreas de meio ambiente e os ecossistemas pode ser
causada, directa ou indirectamente por várias actividades, tais como testes
nucleares, exploração de recursos, práticas extractivas, despejo de produtos
químicos nocivos, emissão de poluentes ou até por guerras. Exemplos de ecocídios em distintos
territórios são, por exemplo, o desmatamento da floresta amazónica, a proposta
de expansão das Athabasca Oil Sands no nordeste do Alberta, no Canadá e águas
poluídas, que representam a morte de mais pessoas do que todas as formas de
violência, incluindo a guerra.
Em todos
os exemplos dados de ecocídio, a extensão da "destruição, perda ou
dano" sofrido requer uma análise. Considerando
que a "destruição" e "perda" são fáceis de verificar por
meio de dados, o que constitui um "dano" com a finalidade de
estabelecer o crime de ecocídio é mais complexa. A duração, tamanho e importância do
impacto de danos a um território, na maioria dos casos deve ser relevante para
determinar se o crime efectivamente se verificou.
O
Estatuto de Roma estabelece uma definição alargada de danos ao meio ambiente,
especificamente como consequência de Crimes de Guerra, que presta assistência
útil. Artigo 8 (2) (b) (iv)
criminaliza:
“prejuízos extensos, duradouros e graves no meio ambiente que se
revelem claramente excessivos em relação à vantagem militar global concreta e
directa que se previa”.
A
formulação utilizada foi adoptada a partir da Convenção das Nações Unidas de
1977 sobre a Proibição do militar ou qualquer outro uso hostil de Técnicas de
Modificação Ambiental (ENMOD). ENMOD
especifica os termos "generalizado", "longa duração" e
"grave", como
"Generalizado": abrangendo uma área na escala de várias
centenas de quilómetros quadrados;
"longa duração": com duração de um período de meses, ou
aproximadamente uma estação;
"grave": envolvendo perturbação séria/ significativa ou
dano à vida humana, a recursos naturais e económicos ou a outros bens.
Estas definições, já
constantes de leis internacionais de guerra, oferecem uma base sobre a qual o
crime internacional de ecocídio pode ser tratado pelo TPI (Tribunal Penal
Internacional).
A palavra
"ecocídio" fornece o nome que falta e uma mais completa compreensão
do crime de dano ilícito para um determinado ambiente. Como um crime que não se
restringe aos limites da guerra, a categorização do ecocídio como um crime
contra a paz é apropriada.
Assim, para efeitos da
definição do "dano" resultante de ecocídio, haverá que determinar se
a extensão dos danos ao meio ambiente é "generalizada, a longo prazo e
grave", o que pode ser aplicado em tempos de paz, bem como em tempos de
guerra.
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