sexta-feira, 20 de abril de 2012

O Princípio da Prevenção e a AIA

A prevenção traduz-se, numa perspectiva positiva, na tomada de medidas de antecipação e de minimização dos riscos de poluição, de efeitos negativos que lesem o Ambiente.
O princípio da prevenção é um princípio basilar do Direito do Ambiente, estando presente nos artigos 66.º/2 a) da CRP e 3.º/a) da LBA, uma vez que antecipar os efeitos eventualmente negativos ao ambiente é imprescindível.
No entanto, na sociedade actual, há toda uma multiplicidade de interesses a conjugar, situação que por vezes parece quase impossível, dada a tendencial relação de antagonismo em que se encontram. Falamos aqui de direito de iniciativa económica, de investigação e de actuação do sujeito destinatário da autorização. Sobrepor-se-ão estes direitos à defesa do direito do ambiente?
O instrumento privilegiado da prevenção é o procedimento de avaliação de impacto ambiental, que se traduz num acto que dá corpo a todas as subsequentes decisões nos procedimentos autorizativos com incidência ambiental, incorporando as condições e limitações impostas ao operador.
O objectivo deste pequeno texto é fazer um breve excurso pelo diploma que prevê a AIA. Este procedimento é aplicável aos projectos susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente conforme os presentes nos Anexos I e II (1.º/3, a) e b) do RAIA); e é também aplicável aos projectos elencados no anexo II, ainda que não abrangidos pelos limiares nele fixados, que, de acordo com o Anexo V do RAIA, a entidade coordenadora considere poderem causar efeitos significativos no ambiente (artigo 1.º/4 e 2.º A do RAIA), bem como aos projectos que, através de despacho conjunto do Ministro do Ambiente e do Ministro responsável pela área na qual se inserem, se entenda necessário submeter a avaliação de impacto ambiental (artigo 1.º/5 do RAIA).
A questão é que, embora exista como princípio basilar a sujeição a procedimento de avaliação de impacto ambiental, este pode ser encurtado ou mesmo dispensado em determinadas situações, verificados determinados pressupostos.
Atente-se logo na dispensa prevista no artigo 3.º, por decisão conjunta do Ministro do Ambiente e da pasta relacionada. Esta excepção pode pôr em causa o princípio da prevenção, uma vez que a expressão "circunstâncias excepcionais" é demasiado ampla, já que o legislador também não a define o que, constituindo uma espécie de norma habilitante em branco, esta cláusula de salvaguarda pode dar azo a abusos, pois o controlo desta aplicação é verdadeiramente difícil. Assim sendo, passa-se como que “um cheque em branco” ao Governo, na medida em que numa área tão sensível como esta, talvez não seja muito indicada a utilização de um conceito com tão elevado grau de indeterminação.
Também o artigo 1.º/6 permite tal dispensa nos casos de defesa nacional: pode acontecer dispensa parcial, tal como pode o Ministro decidi-lo se estiver em causa a segurança interna (impacto ambiental), sendo que o resultado será semelhante, apesar de meios de alcance diferente. É necessária fundamentação, prevalecendo, em caso de conflito, o princípio “in dubio pro Ambiente”.
Esta dispensa implicaria que o proponente apresentasse o projecto e indicasse os eventuais efeitos no Ambiente: um estudo de impacto ambiental. O EIA será, pois, a peça mínima que permite à Administração avaliar os principais efeitos no ambiente. Todavia, o EIA não é vinculativo para os Ministros que emitirão a decisão de dispensa da AIA.
Insistindo, a autoridade da AIA terá que dar um parecer. Este, que sendo favorável, é obrigatório, mas não é vinculativo (artigo 98.º/2 do CPA); e que sendo desfavorável, também não vincula o Ministro. Logo, o Relatório da Autoridade da AIA pode ignorar o seu sentido, permitindo ao Ministro, apesar da desfavorabilidade, emitir DIA favorável ou condicionalmente favorável. Seguindo as considerações, o Ministro do Ambiente deveria estar vinculado a um parecer negativo da Comissão de Avaliação quanto à emissão de DIA favorável, de forma a respeitarem-se os princípios da prevenção e da prossecução do interesse público ambiental. Mas já é de aceitar mais a recusa da emissão de DIA perante um parecer favorável, caso se entendesse inoportuna a viabilização do projecto no caso concreto.
O princípio da prevenção tem concretização expressa no artigo 19.º do RAIA. No entanto, há deferimento tácito: pode haver valoração positiva do silêncio. Corre-se o risco de, através desta forma, serem viabilizados projectos, o que esvazia assim o procedimento de impacto ambiental, em alguns casos. O RAIA admite o deferimento tácito do pedido de apreciação da conformidade, caso decorram 50 dias sobre a sua recepção e nada seja decidido pela Autoridade da AIA (artigo 28.º/7). Mais uma vez se permite a violação da lógica subjacente ao princípio de prevenção, mas vai ao encontro da solução consagrada em sede geral, de deferimento tácito do pedido. Esta valoração positiva do silêncio esvaziará, na grande maioria dos casos, os princípios da prevenção e da gestão racional dos bens naturais, uma vez que legitima a demissão da Administração da sua tarefa de ponderação de interesses.
 A permissão do deferimento tácito é uma desconsideração ao Direito Ambiental constitucional, legal e comunitário (artigos 66.º/2/a) da CRP, 3.º/a) da LBA, e 174.º/2 do Tratado de Roma).
Há que ter em conta a revisão que o diploma sofreu em 2005 que deveria ter adaptado a solução decorrente do nº 11 do artigo 3.º à nova legislação processual administrativa. Consequentemente, não faz sentido manter o deferimento tácito perante a nova acção administrativa especial de condenação da Administração à prática do acto legalmente devido.
Em abstracto, o deferimento tácito viola o princípio da prevenção, mas em concreto irá depender da situação em análise.
Concluindo, a DIA estabelece, teoricamente, um importante instrumento de prevenção de impactos no ambiente, uma vez que o procedimento de AIA pondera interesses ecológicos, sociais, económicos, culturais, sanitários. Porém, na prática e na realidade, são bastantes os desvios admitidos pelo RAIA relativamente à observância do princípio da prevenção pondo em causa o propósito da protecção do ambiente.

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