Uma das questões
mais discutidas pela Doutrina, quanto ao Direito do Ambiente, continua a ser
qual a sua natureza jurídica e o facto de ser ou não um Direito Fundamental.
Inegável
é que o Ordenamento Jurídico Português consagra, sem qualquer margem para dúvidas,
um direito dos cidadãos ao ambiente, sendo então este considerado não só um
direito, como um valor que assume uma dimensão cada vez maior na comunidade
portuguesa, apesar da relativa novidade da problemática político-cultural e jurídica
do ambiente.
Podemos
considerar que a nossa Constituição é verdadeiramente consistente e sistemática
no que refere a questões ambientais, já que nela encontramos não só princípios objectivos
constitucionais, como direitos e situações constitucionais (como por exemplo o
artigo 66 que, no seu número um, consagra um direito global a um ambiente da
vida humana sadio e ecologicamente equilibrado, bem como o correspondente dever
de defender esse mesmo ambiente). Também o artigo 66 revela também que o direito ao
ambiente é constitucionalmente considerado como um direito autónomo
relativamente aos outros e, nesta linha, um direito fundamental.
Concluímos
que, na nossa ordem jurídica, o direito ao ambiente é efectivamente um direito que tem o mesmo conteúdo que qualquer outro direito fundamental
plasmado na nossa Lei Fundamental. O ambiente é não só acolhido como um direito do cidadão, como é considerado uma tarefa fundamental do Estado
(art. 9, alíneas d) e e)), e comporta uma dimensão negativa ao lado de uma
dimensão positiva: negativamente, há um direito
à abstenção de comportamentos gravosos para o ambiente por parte de terceiros e
do Estado. Positiva, porque cada um tem o direito a que o Estado actue para
defesa do ambiente e, neste aspecto, trata-se de um verdadeiro direito social.
Importa
colocar mais algumas questões para se concluir uma análise completa quanto à
natureza jurídica do direito ao ambiente. Desde já: estamos perante um direito
subjectivo?
Obviamente
que não podemos negar a dimensão pública e colectiva do ambiente; porém, é
certo que essa dimensão não apaga a também incontestável vertente subjectiva. Se
o ambiente é um bem social de cariz público, é também um direito subjectivo
dotado de uma dimensão pessoal, inerente a qualquer pessoa e, ainda, inalienável.
Esta consideração leva-nos a concluir que a componente subjectiva do direito ao
ambiente não pode ser ofuscada pela dimensão comunitária, e que essa componente
é um aspecto essencial da caracterização do ambiente como direito fundamental.
Aliás,
o Professor Vasco Pereira da Silva considera que o direito fundamental ao ambiente é efectivamente um
direito subjectivo, já que os direitos fundamentais assentam num princípio
axiológico, permanente e absoluto, que é a dignidade da pessoa humana. Esclarece
o Professor que o ambiente é simultaneamente um direito subjectivo e uma
estrutura objectiva da colectividade, enquanto nega a ideia de que estamos na
realidade perante um interesse difuso. Acrescenta ainda que se um direito tem a
natureza de direito subjectivo, deve ser qualificado como um Direito, liberdade
e garantia, devendo atender-se a isso, e não ao local da Constituição em que
está catalogado (e, portanto, não é pelo regime da analogia que se lhes deve
aplicar o regime dos Direitos, liberdades e garantias, mas sim porque o seu
conteúdo é efectivamente de direito subjectivo, cabendo aí naturalmente).
Por
oposição a esta concepção, há quem considere que o facto de o legislador ter
inserido o direito ao ambiente no título III da Constituição (Direitos económicos,
sociais e culturais) revela uma clara opção do legislador em não considerar o
ambiente como um direito fundamental, mas sim como um direito social.
Discordamos desta posição, e mais uma vez sublinhamos a ideia de que o facto de
se qualificar o direito ao ambiente como um direito subjectivo, não elimina a
sua componente social e colectiva, nem o seu carácter de bem jurídico unitário
de toda a comunidade.
Tendo
em conta a caracterização do ambiente como direito fundamental, importa ter
ainda em conta a sua autonomia: tal como já escrevemos, o ambiente, enquanto
bem jurídico e direito fundamental, é dotado de autonomia relativamente aos
outros direitos, mesmo aqueles que lhes são mais próximos e com ele se
relacionam (veja-se, o direito à saúde). No nosso ordenamento jurídico o
ambiente é directamente tutelado como tal, e não como uma forma de alcançar a
tutela de outros direitos.
Em
conclusão, concordamos com o Professor Gomes Canotilho ao afirmar que «a
leitura conjugada das normas constitucionais e das normas legais aponta, desde
logo, para a existência de um direito subjectivo ao ambiente, autónomo e
distinto de outros direitos também constitucionalmente protegidos», bem como
com o Professor Vasco Pereira da Silva, na sua consideração do direito ao
ambiente como um verdadeiro direito fundamental.
Sem comentários:
Enviar um comentário