quinta-feira, 26 de abril de 2012

A responsabilidade pela protecção Ambiental (em particular na Licença Ambiental)


Do tema da responsabilidade ambiental pelas medidas de protecção ambiental cruza-se uma opção política fundamental da comunidade que é saber até onde estamos dispostos a ir, em termos de tutela ambiental, se tivermos de suportar, enquanto contribuintes, pelo menos parte da “factura” que é necessário pagar por tais medidas, quando acarretem a necessidade de indemnizar os agentes económicos que sejam por elas prejudicados.

Para FIGUEIREDO DIAS, a questão coloca-se, antes de mais, no âmbito do direito autorizativo pois é quando o operador de uma instalação poluente que tenha sido legitimamente autorizado pela Administração Pública para a respectiva exploração se vê privado de tal possibilidade ou em que, pelo menos, são colocados novos ónus que se traduzem em maiores dificuldades, também económicas, à exploração da actividade, por intermédio da modificação do título autorizativo em que se sustenta, que o problema pode surgir.


A função estabilizadora dos actos autorizativos ambientais tem vindo a ser enfraquecida, abrindo o caminho para a sua flexibilidade por intermédio da formulação de obrigações dinâmicas e duradouras dos operadores autorizados, da aposição de cláusulas acessórias, da exigência de renovação do acto, do aumento das possibilidades de modificação administrativa e, no limite, a sua revogação.


Tal tendência, entre o conforto da estabilidade e flexibilidade, entre segurança jurídica, actos constitutivos de direitos, protecção da confiança e proibição de retroactividade, é especialmente sentida ao nível de licença ambiental outorgada ao abrigo do regime da prevenção e controlo integrados da poluição (doravante, PCIP) . Para PEREIRA DA SILVA, nestas normas é sentida de forma muito particular a renovação da própria noção de decisão administrativa. Já antes da consagração deste regime, GOMES CANOTILHO, alertou para uma “nova reserva da Administração”: a reserva de imposição de condições supervenientes apontando no mesmo sentido de flexibilização do acto autorizativo ambiental.


Face ao exposto, cabe referir o teor da norma do art. 18º nº3 do PCIP, determinando a previsão na licença ambiental de condições suplementares que garantam o cumprimento do objectivo da qualidade ambiental. Para CARLA AMADO GOMES, estamos perante uma cláusula geral habilitante da inserção de modos necessários a uma protecção eficaz dos interesses públicos em jogo.


Centremo-nos, de novo, na licença ambiental outorgada ao abrigo do regime do PCIP. Resulta do regime que estamos perante um acto administrativo que se afigura como tendencialmente precário, flexível, dinâmico e aberto à actualização, modificação ou mesmo extinção, dando dele resultando uma menor protecção da confiança e daquilo que é “adquirido” por parte dos seus titulares.


FIGUEIREDO DIAS, avança com um princípio da instabilidade da licença ambiental e aponta-o fundamentadamente: desde logo, o facto de as obrigações do operador autorizado, previsto no art. 5º, serem dotadas de durabilidade e de dinamismo; a circunstância de a licença ser um acto sujeito a termo final, com um prazo de validade definido no art. 18º nº2 al g): possibilidade de renovação antecipada da licença antes da verificação do termo final, segundo o art. 20º nº3 e 4. De acordo com estes preceitos, à sua revisão períodoca acresce uma a modificação oficiosa[1]. A própria Directiva 96/61/ CE DO Conselho, de 24 de Setembro que estabeleceu a disciplina originária da PCIP ao prever no art. 13º o reexame e actualizaçao das condições de licenciamento pela autoridade competente. Uma vez que nada é contemplado quanto à possível atribuição de um direito de indemnização aos titulares de posições jurídicas consolidadas, a Doutrina reconhece não haver tão-pouco previsão de reservas de direitos adquiridos, reforçando as possibilidades administrativas neste âmbito.


Para CARLA AMADO GOMES este princípio da instabilidade da licença ambiental reflecte-se, sobretudo, no facto de a licença ter inerente um princípio de revisibilidade (contraposto ao principio de estabilidade da relação jurídica administrativa), uma nova lógica de prevalência de interesses ambientais sobre os direitos de propriedade e de iniciativa privada.


A possibilidade de antecipação do termo da licença por parte da APA (art. 20º nº3 e 4), no caso de não ter havido alteração das condições de exploração constituirá uma revogação substitutiva sendo também defensável a possibilidade de revogação pura e simples da licença nos casos em que a Administração imponha ao operador novos condicionalismos ou deveres com a prescrição de que se ele não forem cumpridos a licença será revogada, como admite FILIPA CALVÃO.


O que pretendemos agora é essencialmente saber quando é que tais alterações da licença ambiental em especial a exigência da sua renovação que pode configurar uma revogação substitutiva ou uma revogação parcial com substituição justificam a atribuição de uma indemnização ao operador autorizado.


No regime nacional (contrário ao Alemão) não há qualquer regra a prever indemnizações, pelo que se poderia à partida dizer que cabe à Doutrina e à Jurisprudência determinar em que casos é que a imposição da renovação da licença ambiental ao operador configura uma revogação substitutiva digna de tutela, isto é, se o risco de modificação da licença corre exclusivamente por conta do operador ou se há situações em que a Administração deve assumir, sendo a “factura” paga por toda a comunidade.


No fundo, a questão passa por determinar quando é que o sacrifício do operador é digno de tutela quando se justifica a atribuição ao operador autorizado de um indemnização por actos ilícitos em virtude da obrigatoriedade de requerer a renovação da licença ambiental com base no art. 20º nº3 PCIP.


CARLA AMADO GOMES propõe que nos casos de revisão intensa e muito antecipada da licença em que a Administração acabe por a revogar se deve equacionar a atribuição de uma indemnização por facto lícito ou mesmo atribuição de uma indemnização de imprevisão para ajudar o operador a suportar os custos da transição.


Assim, fica em boa medida no ar e deixado nas mãos da Doutrina e Jurisprudência determinar os casos em que as disposições permitem uma revogação parcial ou substitutiva das licenças ambientais, disposições estas destinadas à tutela do interesse publico ambiental, chocam de maneira insuportável com os direitos fundamentais de propriedade e livre iniciativa económica dos operadores autorizados, violando a sua confiança digna de tutela e segurança jurídica que nesse caso deverá prevalecer justificando o ressarcimento dos danos e a indemnização dos operados autorizados.






Bibliografia

LEITÃO, Menezes, "A responsabilidade civil por danos causados ao ambiente"in A responsabilidade civil por dano ambiental: Actas do colóquio / coord. Carla Amado Gomes e Tiago Antunes, ICJP, 2009;
SILVA, Vasco Pereira da, Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente”, Almedina, 2ª Reimpressão da Edição de 2002.
O procedimento de licenciamento ambiental, Revista O Direito, ano 14º, 2008




[1] Uma vez que, sempre que se verifique uma das circunstâncias previstas naquele nº3 da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), determina ao operador a obrigatoriedade de este requerer a renovaçao (antecipada) da licença ambiental.

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