quinta-feira, 26 de abril de 2012


A Repercussão do Princípio do Poluidor Pagador no Direito do Ambiente: serão os poluidores os verdadeiros pagadores?

  Um dos pontos mais polémicos do princípio do poluidor pagador e que constitui o cerne das críticas movidas pelos mais cépticos relativamente à bondade jurídica do princípio é o de saber se os poluidores serão sempre os verdadeiros pagadores.
  Nesta vertente, as críticas feitas a este princípio são de três ordens:

®    Do setor da Ecologia critica-se o princípio do poluidor pagador por este ser uma verdadeira “compra do direito a poluir”, cujo preço nem sequer é pago pelos poluidores mas sim pelos consumidores;

®    Do setor do Direito critica-se este princípio por conduzir a situações de extrema injustiça, já que quem na realidade paga são os consumidores e não os poluidores;

®    Do setor Económico critica-se o fato deste princípio ser gerador de inflação, devido ao fenómeno da repercussão.

  O fenómeno da repercussão, assente a todas estas críticas, é um fenómeno semelhante ao que no campo fiscal se designa de repercussão do imposto. Trata-se de uma não coincidência entre o sujeito sobre quem impende a obrigação de entregar o imposto (o sujeito passivo) e quem efetivamente paga (o contribuinte) e decorre da possibilidade que alguns agentes económicos têm de transferir para outrem os encargos a que estão sujeitos.
  Este fenómeno de repercussão engloba o domínio das medidas de política do ambiente, nas quais certos poluidores gozam da possibilidade de fazer os consumidores suportar, através do aumento dos preços, de pagamentos que tiveram de efetuar. Isso acontece quando os poluidores que pagam são produtores. Aqui a divergência verifica-se entre quem efetivamente suporta os custos das medidas ambientais impostas pelo Estado, e quem tem de efectuar o pagamento (quem “paga primeiro”).
  A repercussão só não acontece quando se verifiquem duas situações que, sendo exteriores à empresa, condicionam determinantemente as suas decisões com a estrutura concorrencial ou monopolista do mercado em que a empresa se insere, e a existência no mercado de produtos sucedâneos do produto considerado.
  A repercussão distingue-se em repercussão externa e repercussão interna. A repercussão externa ou em sentido próprio consiste na transferência de pagamentos efetuados pelo poluidor para os seus clientes e opera-se pela inclusão dessas despesas, como um custo, no preço final dos bens ou serviço onerado reflexamente o respectivo adquirente. Já a repercussão interna engloba as situações em que não seja praticável uma repercussão externa. Nestes casos, os custos acrescidos são transferidos, não para os consumidores através dos preços dos produtos, mas dentro da própria empresa, através dos preços dos fatores de produção. A repercussão interna processa-se através de alterações da remuneração relativa dos diversos fatores de produção. Por exemplo, se há que suportar que uma nova taxa ecológica e por algum motivo não é possível aumentar proporcionalmente os preços dos produtos, como compensação, contraem-se as despesas com o fator trabalho (reduzindo o número de trabalhadores ou o número de horas de trabalho por trabalhador), com a matéria-prima (utilizando materiais mais baratos), com o capital (não introduzindo nova maquinaria).
  Como consequências da repercussão, a própria OCDE tem uma posição de neutralidade face à transferência dos custos dos poluidores para terceiros, afirmando que do ponto de vista do Princípio do Poluidor Pagador, não interessa se o poluidor transfere para os seus preços parte de todos os custos ambientais ou se os absorve.
  Como consequências económicas e ecológicas, é inegável que, aplicando aos produtores o Princípio do Poluidor Pagador, pode ter por efeito a subida dos preços, devido à probabilidade de repercussão externa. Todavia, da ponderação deste inconveniente económico e das restantes vantagens económicas ecológicas, resulta que a aplicação do princípio é largamente compensatória. Não se trata, na realidade, de uma subida de preços “inútil”, na medida em que a repercussão externa tem consequências económicas vantajosas, mesmo que uma política de proteção do ambiente muito rigorosa leve as empresas à rutura financeira, inibindo assim a instalação da crise económica no setor considerado.
  Por outro lado, a repercussão não é, em si mesma, contrária à “filosofia” do Princípio do Poluidor Pagador, pois tem benéficos efeitos ecológicos, já que o aumento dos preços provavelmente provocará uma desejável contracção da procura de um produto que é, em si mesmo, poluente ou cuja produção ou consumo são geradoras de poluição. De fato, um preço mais elevado está mais próximo do preço ideal dos recursos esgotáveis e tem uma vantagem de restringir o consumo desses bens aos usos essenciais.
  Acresce que o fato de o poluidor-que-paga (o produtor) não suportar, em último termo, o custo que lhe é imposto, não significando que não se realize a pretendida internalização. O produtor também “repercute” nos preços os custos dos tradicionais fatores de produção (matéria-prima, trabalho e capital) e isso não significa que não sejam verdadeiros custos ou que não os pague.
  Por fim, este efeito de subida dos preços dos produtos direta ou indiretamente poluentes, não pode, rigorosamente, ser considerado “inflação”. A inflação é uma subida, contínua e generalizada, dos preços, que afeta quase todos os produtos e serviços. Neste caso, há apenas uma alteração relativa dos preços dos produtos e note-se que, uma subida do preço dos produtos poluentes é equivalente a uma descida dos produtos não poluentes.  

Sem comentários:

Enviar um comentário