O
povoamento na Região Autónoma da Madeira foi iniciado junto à foz
das ribeiras, locais onde foram edificados as primeiras igrejas e
habitações. Não se adivinha inicialmente que periodicamente
ocorriam tempestades que engrossariam os caudais das ribeiras e
poderiam até transbordar e inundar as edificações.
Vários
casos ocorreram ao longo dos anos em 1724 , 1765, 1803, 1815, 1842,
1848, 1859, 1876, 1895, 1901, 1920, 1993 , 2001 e por ultimo o famoso
20 de Fevereiro de 2010. Contundo, isto não pareceu assustar
suficientemente o governo regional pois continua-se a construir
edifícios junto ás ribeiras e até por cima das mesmas como é o
caso recente do centro comercial Dolce Vitta ou o edifício das Minas
Gerais, estrangulando-se os seus leitos. A verdade é que estes
leitos quando obstruídos podem ser um enorme perigo para as
populações e para o meio ambiente porque os cursos de agua sofrem
desvios, diminuição dos seus leitos e obstrução de alguns
espaços. Constatou-se que 67% das ribeiras encontram-se com obras e
somente 33% encontram-se sem obras.
Na
Madeira não existem lagos nem rios, sendo as ribeiras as únicas
zonas húmidas com a presença de agua doce que permitem o
desenvolvimento de um ecossistema próprio com as respectivas
espécies, notando-se assim a relevância em preservar este mesmo
ecossistema. É chocante o contraste existente entre as ribeiras que
se situam na zona norte da Ilha pela limpeza das suas aguas e pureza
com as ribeiras situadas no centro da cidade pela quantidade de lixo
nelas depositado tornando as aguas poluídas e tornando a vida
insustentável para muitas espécies nelas residentes. Podemos
constatar que existem vários tipos de resíduos nas ribeiras : lixo
domestico, terras, entulhos e monstros fazendo com que apenas 6% das
aguas se encontrem limpas.
Estes
ecossistemas deviam possuir uma maior protecção e atenção por
parte da população numa perspectiva de ordenamento do território
como locais privilegiados para o desenvolvimento de zonas verdes.
Note-se
contundo que as tempestades nomeadamente o 20 de Fevereiro não foram
causadas exclusivamente nem essencialmente pela artificialização
das ribeiras e poluição mas antes pela intensidade da precipitação
conjugadas com a orografia da ilha que contribui para aumentar os
efeitos da catástrofe. Mas não se poderá negar que erros de
planeamento urbanístico tais como estreitamento de leitos das
ribeiras e a construção legal ou ilegal dentro ou muito próximo
dos cursos de agua tenha contribuído para o agravamento da
catástrofe.
Nomeadamente
o partido politico CDU-Madeira, recorreu á procuradoria geral da
republica para apurar responsabilidades criminais dos governantes
pelas mortes ocorridas no 20 de Fevereiro, pois compete ao governo
proteger zonas marcadas por riscos desta natureza.
Embora
nos primórdios da história o meio ambiente fosse visto antes como
um bem á disponibilidade do Estado, que este poderia utilizar, hoje
o meio ambiente é um bem de uso comum e ao Estado cabe antes
preserva-lo podendo ser responsabilizado por eventuais danos. Como
sabemos a nossa Constituição ocupa-se das questões ambientais
tanto numa perspectiva subjectiva, como direitos fundamentais, como
numa perspectiva objectiva enquanto bens jurídicos que impõem
tarefas estaduais. Falou-se em responsabilidade funcional por parte
do Estado uma responsabilidade objectiva por dano ambiental
nomeadamente por omissão da protecção devida ás ribeiras da
Madeira. Contundo a Procuradoria Geral da Republica não acudiu esta
ideia pois considerou que não havia nexo de causalidade suficiente,
pois a tempestade do 21 de Fevereiro não foi como já vimos
exclusivamente causada pelo mau ordenamento do território. Raimundo
Quintal reconhecendo a não exclusividade da culpa considera contudo
lamentável não ter havido qualquer consequência para os
governantes alertados inúmeras vezes pela população e pelos
engenheiros do ambiente para o possível transbordar das ribeiras, e
ainda assim estrangulando cada vez mais os seus leitos.
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