O Direito ao Ambiente, como já todos sabemos, está
consagrado constitucionalmente através de uma dupla dimensão: Uma dimensão objetiva
– em que é visto como uma função fundamental do Estado (art. 9º alinhas d) e
e)) – e uma dimensão subjetiva – que prevê uma tutela dos valores ambientais
(art. 66º da CRP).
Ora considerando que o Homem
é um ser sofisticadamente natural, este busca frequentemente maneiras de
expandir a sua personalidade, encontrando na prática desportiva uma ótima manifestação
da sua individualidade e carácter.
As razões que levam ao
aumento da prática desportiva podem estar relacionadas com o culto do corpo,
com a moda, ou mesmo com a busca de hábitos saudáveis, tendo o Estado o dever fundamental de a promover. A
Constituição portuguesa prevê-o em dois artigos – 79º nº2 e 70º nº1 al. d) e
nº2 – tendo obtido também concretização legal na Lei n.º 5/2007, de 16 de
Janeiro, a Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto (doravante LBD) –
artigos 6º a 8º.
O Desporto, além de
direito fundamental social, está também associado ao direito ao livre
desenvolvimento da personalidade e ao direito à saúde.
Sendo a maior parte das atividades
desportivas praticadas ao ar livre e em contato com a natureza e tratando-se de
um veículo de sensibilização dos praticantes para a necessidade de proteger o
meio natural, o Desporto e o Ambiente são dois conceitos que se encontram estreitamente
ligados.
Dado que a LBD atual não
nos fornece nenhum conceito de Desporto,
há que remeter a 1992, ano da adoção da Carta Europeia do Desporto, cujo art.
2º nº1 al. a) o definia como “qualquer
forma de atividade física que, através de uma participação organizada ou não,
têm por objetivo a expressão ou o melhoramento da condição física e psíquica, o
desenvolvimento das relações sociais ou a obtenção de resultados na competição
a todos os níveis”.
Foi também concretizada
na legislação, uma lista a título exemplificativo das atividades qualificadas
como Desportos de Natureza, no artigo
3º nº3 do Decreto Regulamentar n.º 18/99, de 27 de Agosto:
“a) O pedestrianismo;
b) O montanhismo;
c) A orientação;
d) A escalada;
e) O rapel;
f) A espeleologia;
g) O balonismo;
h) O pára-pente;
i) A asa delta sem motor;
j) A bicicleta todo o
terreno (BTT);
l) O hipismo;
m) A canoagem;
n) O remo;
o) A vela;
p) O surf;
q) O windsurf;
r) O mergulho;
s) O rafting;
t) O hidrospeed;
u) Outros desportos e atividades
de lazer cuja prática não se mostre nociva para a conservação da natureza”.
Mas a verdade é que estas
duas realidades – Ambiente e Desporto – são susceptíveis de entrar em confronto: Certo desporto pode determinar
o desgaste do meio biológico em que se desenvolve, principalmente se possuir
carácter periódico, for um desporto de competição, que “mova multidões” e
obrigue à instalação de grandes infraestruturas, gerando emissões de gases
poluentes. Segundo a expressão utilizada pela profª Carla Amado Gomes, existe “uma
relação de amor-odio entre o ambiente e o desporto”.
Busca-se uma estabilidade
entre essas duas realidades através do artigo 31º da LBD, com a epígrafe “Desporto
na natureza”:
“1 - A atividade física e a prática desportiva em espaços naturais devem
reger-se pelos princípios do respeito pela natureza e da preservação dos seus
recursos, bem como pela observância das normas dos instrumentos de gestão
territorial vigentes, nomeadamente das que respeitam às áreas classificadas, de
forma a assegurar a conservação da diversidade biológica, a proteção dos
ecossistemas e a gestão dos recursos, dos resíduos e da preservação do
património natural e cultural.
2 - As atividades mencionadas no número anterior
devem contribuir para a divulgação e interpretação do património natural e
cultural, a sensibilização e educação ambientais e a promoção do turismo de
natureza.”
A sua relação pode ser
vista, através de duas perspetivas:
·
Sentido
Positivo – proporciona ao praticante o contacto com a natureza e a oportunidade
privilegiada de valorizar-se para além do desporto, aproximando-se do património
natural e cultural (nº2).
·
Sentido
Negativo – a prática desportiva encerra perigos para a natureza por via dos
diferentes e múltiplos impactes que pode acarretar.
Impõe-se então, o controlo prévio sobre essas atividades
que possam provocar impactos negativos e significativos no meio ambiente, de
forma a salvaguardar os recursos frágeis e de interesse coletivo.
Este artigo 31º constitui
o ponto-de-partida de um conjunto de medidas tendentes a prevenir e a minorar
os efeitos negativos da prática desportiva e a valorizar os benefícios dessa
prática no que toca à educação ambiental dos agentes desportivos.
O Estado tem então um papel fundamental no âmbito legislativo de
forma a limitar a ingerência das autoridades administrativas com competência em
sede ambiental. Daí ser imperativa a definição de critérios de planificação
territorial ecologicamente conformados das estruturas aptas a receber eventos
desportivos, bem como de criação de espaços verdes em centros urbanos, que
seduzam as pessoas para práticas desportivas saudáveis e de proximidade. A
Administração deve também ser dotada de competências autorizativas e de
fiscalização de eventos desportivos no meio natural.
A massificação do desporto, quer por força de fatores extrínsecos,
como o aumento do número de espectadores graças aos media e ao aproveitamento publicitário destes, quer por fatores
intrínsecos, como o aumento do número de modalidades e de praticantes
devido à consciencialização dos benefícios para a saúde e dos enormes
dividendos financeiros associados à prática profissional de determinados desportos
(p.e., o futebol), originou a responsabilidade pela divulgação e adoção de princípios
de sã convivência entre desporto e ambiente, pelas respetivas federações
desportivas.
A importância deste tema
atingiu enormes proporções, tendo -se dele ocupado algumas organizações
internacionais, como o Conselho da Europa, destacando-se, no entanto, o Comité Olímpico Internacional, um dos
mais empenhados ativistas da causa ambiental.
Esta instituição tem como
estandartes a promoção e o apoio da consciencialização quanto às questões
ambientais e a promoção do desenvolvimento sustentável no desporto.
Tendo isso em vista,
definiu o Ambiente como uma terceira dimensão do movimento olímpico – traduzida
na realização de inúmeras conferências mundiais e regionais sobre o tema; na
criação de uma comissão dedicada ao meio ambiente; na colaboração com o
programa da ONU para o Ambiente; e finalmente, no estabelecimento de manuais de
candidatura à organização dos Jogos Olímpicos, com restritos requisitos
ambientais.
A sua primeira manifestação
foram os Jogos Olímpicos de Sidney, em 2000, seguidos do Campeonato do Mundo de
Futebol de 2006, na Alemanha, considerado o primeiro grande evento desportivo
climaticamente neutro, e mais recentemente, os Jogos Olímpicos de 2008, em
Pequim.
BIBLIOGRAFIA:
Ø GOMES, Carla Amado, Ambiente e Desporto: Ligações Perigosas, in Separata de Desporto
& Direito – Revista Jurídica do Desporto, Ano VI – nº 17 – Janeiro/Abril
2009, Coimbra Editora
Ø MEIRIM, José Manuel, Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto – Estudos, Notas e
Comentários, 1ª Edição, 2007, Coimbra Editora
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