Actualidade:
Como é do conhecimento de todos,
Portugal atravessa presentemente um período de seca bastante preocupante,
colocando sobretudo os agrários numa posição realmente desconfortável. Perante
esta conjuntura, o nosso país vê-se então forçado a negociar com a União
Europeia a antecipação de ajudas de cariz económico, de modo a enfrentar-se a
perda de rendimento que muitos agricultores estão a ter devido a este fenómeno,
que se tem mesmo prolongado e tornado deveras intenso.
Segue-se uma notícia actual que ilustra
toda esta realidade:
Fonte: Jornal de Notícias.
Recuperado
em 2012, Abril 17, de http://www.jn.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=2384816
Que fenómeno é este?
A seca é um fenómeno hidrológico
extremo que pode ser definido como uma diminuição conjuntural significativa dos
recursos hídricos durante um período suficientemente prolongado que afecta uma
extensa área com consequências socioecónomicas adversas. Este é um fenómeno
normal e recorrente do clima, no entanto, muitos consideram erroneamente que se
trata de um fenómeno excepcional. Para além disso, tem um carácter lento e
progressivo, de forma que quando se manifesta de maneira evidente já estamos
imersos nele. No que toca ao nosso país, a ocorrência de episódios de seca é um
fenómeno que acontece, em grande parte, pela própria situação geográfica do
mesmo, pelo que não constitui propriamente um problema isolado e
circunstancial, mas um elemento climático de determinada frequência no sentido
que já ocorreu no passado. Contudo, as consequências que actualmente assistimos
ditam-nos a gravidade do problema. A verdade é que apesar de recorrente, está
mesmo a afectarmo-nos de forma persistente e a trazer-nos dificuldades
enormíssimas.
Quanto a este fenómeno, pode-se
fazer uma distinção entre dois tipos de secas: uma mais directamente associada
ao armazenamento das albufeiras, lagoas, aquíferos e das linhas de água em
geral, denominada seca hidrológica, e outra ao estado de não ocorrência de
chuva, a intitulada seca meteorológica. Centremos a nossa atenção apenas nesta última.
Precisando melhor, esta seca é a medida do desvio da precipitação em relação ao
valor normal e caracteriza-se pela falta de água induzida pelo desequilíbrio
entre a precipitação e a evaporação, a qual depende de elementos como a
velocidade do vento, humidade do ar, temperatura e isolação. Contudo, a verdade
é que a enunciação de seca meteorológica deve ser ponderada como estando
dependente da região, já que as condições atmosféricas que resultam em
deficiências de precipitação podem ser muito divergentes de umas zonas para as
outras.
Na altura de analisar um período de
seca, devemos ter em conta que as condições hidrometeorológicas que o ocasionem
têm uma influência variável, de acordo com o grau de desenvolvimento dos seus
aproveitamentos hidráulicos e com a procura de água da região. Em situação de
seca declarada coloca-se a questão da priorização das utilizações da água e as
medidas a tomar nesse sentido. Portugal, não foi excepção à regra e também
tomou as suas próprias medidas. Como tal, cabe-me fazer referência à Resolução
do Conselho de Ministros nº 37/2012, que demonstra, de forma notória, que as
previsões disponíveis, tanto as de curto como as de médio prazo apontam para
uma manutenção de ausência de precipitação significativa. De facto, a
precipitação acumulada até à data faz com que o ano hidrológico 2011-2012
apresente um desvio superior a 50% em relação a um ano normal. Com efeito, o
Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território
(MAMAOT), através das direcções regionais de agricultura e pescas, tem vindo a
monitorizar os efeitos da seca no terreno. Dada a urgência da matéria e a
transversalidade das soluções, decidiu então o Conselho de Ministros pela
publicação de um conjunto de medidas relevantes, que podem ser devidamente
observadas neste mesmo documento. O objectivo é acima de tudo, garantir condições
para uma célere execução das mesmas, das quais se destacam as que foram
pensadas para o âmbito dos regimes de rega públicos e logística.
Continuando a análise desta matéria,
a seca não se traduz unicamente num fenómeno físico ou um evento de natureza. A
seca tem sérios efeitos sobre a população de abastecimento de água. Além disso,
tem efeitos económicos e ambientais importantes, tanto nos países em
desenvolvimento como em países desenvolvidos, que tornam patente a
vulnerabilidade da sociedade diante deste fenómeno da natureza. Fenómeno, esse,
cujo desastre natural na sociedade tem um impacto muito alto. De facto,
estima-se que os impactos da seca sejam maiores que os de qualquer outro
desastre natural. Entre os impactos económicos, os primeiros, sem dúvida, são
os prejuízos causados pela seca na agricultura. Este sector é tratado com
preferência, especialmente naqueles países em que as secas são mais frequentes.
Além deste impacto, a seca tem também impactos negativos directos na gestão da
água. A escassez prolongada de água influi directamente nos recursos hídricos
de uma região, altera as condições de equilíbrio da água e cria situações
difíceis para qualquer tipo de abastecimento. O terceiro campo de efeitos
negativos refecte-se na indústria. Nela, os efeitos são geralmente indirectos. No entanto, a indústria alimentar é envolvida de forma mais directa, uma vez que uma
parte considerável da sua matéria-prima provém da agricultura e pode ser
perdida de forma irremediável durante um período de seca.
Quanto ao meio ambiente, os efeitos
prejudiciais da seca espelham-se nos recursos naturais, nos habitats e nos ecossistemas.
Todavia, estes danos ainda não foram estudados adequadamente, nem foram
considerados de forma exaustiva no passado. O tema surgiu apenas nos últimos
anos. Porém, de salientar especial atenção aos efeitos combinados sobre o meio
ambiente, como o aumento da contaminação e o aumento do volume de diversos
tipos de resíduos e, em particular, os materiais tóxicos. Estes efeitos
complexos são acentuados durante os períodos de seca, especialmente devido à
diluição muito menor e à menor capacidade de depuração dos receptores desses
resíduos.
No âmbito desta matéria, há ainda
quem afirme que as secas podem ter impactos benéficos em aspectos como a
redução de mosquitos e a redução de custos em gastos com a limpeza de neve e
outras actividades relacionadas. Para além disso, este fenómeno pode ajudar a
controlar os excessos de produção da agricultura e de outros sectores,
contribuindo assim para uma maior estabilidade de preços e para a sobrevivência
daquelas comunidades agrárias que estejam a ser afectadas por problemas de
superprodução. Estes aspectos não são muito estudados, no entanto, a partir
desta perspectiva, uma das estratégias que se propõe para combater os prejuízos
da seca poderia ser a de não se tomar qualquer iniciativa, apenas levar a cabo
projectos para aliviar as camadas sociais e económicas mais ameaçadas. Como
parece óbvio esta posição é bastante minoritária e analisa este fenómeno num
prazo muito curto, não tomando em conta as consequências gravíssimas que podem
decorrer numa situação de longo prazo, em que os benefícios são claramente
inexistentes. A verdade, é que colocando numa balança os benefícios e os
prejuízos deste fenómeno, nem sequer teríamos os pratos equilibrados. Muito
pelo contrário, a desproporcionalidade é tal, que esta posição acaba mesmo por
cair por terra para todos aqueles que estudam e investigam este fenómeno nos seus mais
módicos pormenores.
Para terminar, de referir ainda a Organização
Meteorológica Mundial (OMM). Esta agência especializada das Nações Unidas
coordena a actividade científica mundial para que a informação meteorológica e
outros serviços cheguem com rapidez e precisão a um público cada vez maior, ao
utilizador particular e comercial, além da navegação aérea e marítima
internacional. Com sede em Genebra, esta organização conta com 185 membros e é
a voz científica autorizada em tudo o que concerne ao estado e ao comportamento
da atmosfera e ao clima da Terra. Como tal, propôs definir este fenómeno como a
sequência atmosférica caracterizada pelo desenvolvimento de precipitações 60%
inferiores às normais por mais de dois anos consecutivos. Para o nosso país foi
proposta uma redução de 40% do total para o sudeste e Oeste e cerca de 25% para
a região do Norte. Dado que as secas são fenómenos imprevisíveis, sobretudo na
sua duração, a prevenção e a preparação são elementos chaves para reduzir o seu
impacto. E é mesmo nisso que Portugal se deve centrar. Não basta tomar medidas
apenas quando o fenómeno está em evidência. Pelo contrário: é preciso ir
preparando esta situação com antecedência, de modo que os impactos provocados
não tenham efeitos tao indesejáveis e severos como os que ocorrem actualmente.
Enquadramento jurídico:
No que toca a esta matéria, é de
referir que a mesma não tem sido alvo de esquecimento por parte da União
Europeia. Bem pelo contrário. Sobre esta temática foi deliberada a Directiva
Quadro da Água (Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23
de Outubro de 2000), que estabelece bases de protecção das águas de superfície
interior, assim como das águas de transição, costeiras e subterrâneas. Esta
directiva foi transposta para o direito nacional através da Lei nº 58/2005 de
29 de Dezembro, que já sofreu algumas alterações. Passo a elencar as várias
versões do diploma para uma consulta mais pormenorizada:
·
1º Versão (Lei
nº 58/2005, de 29 de Dezembro)
·
2º Versão (Rect.
nº 11-A/2006, de 23 de Fevereiro)
·
3º Versão (DL nº
245/2009, de 22 de Setembro)
No âmbito desta lei, denominada Lei
da Água, compete à Autoridade Nacional da Água declarar a situação de alerta em
caso de seca e iniciar em articulação com as entidades competentes e os
principais utilizadores, as medidas de informação e actuação recomendadas,
segundo o artigo 8º, nº 2, alínea o). Para além disso, deve ainda promover o
uso eficiente da água através da implementação de um programa de medidas
preventivas aplicáveis em situação normal e medidas imperativas aplicáveis em
situações de seca (alínea p) do artigo enunciado precedentemente). Nesta lei
está igualmente estabelecido um conjunto de medidas para a valorização dos
recursos hídricos, incluindo uma série delas que se destinam, de forma notória,
à protecção contra o fenómeno da seca. Estas medidas podem ser atendidas no
artigo 41º da referida Lei. Porém, passo a enunciá-las, para uma melhor
compreensão da temática em estudo:
·
Dos Programas de intervenção em situação
de seca deve constar a definição das metas a atingir, as medidas destinadas aos
diversos sectores económicos afectados e os respectivos mecanismos de
implementação.
· As medidas de intervenção em situação de seca devem contemplar,
designadamente, a alteração e eventual limitação de procedimentos e usos, a
redução de pressões no sistema e a utilização de sistemas tarifários
adequados.
·
As áreas do território mais sujeitas a maior escassez hídrica devem ser
objecto de especial atenção na elaboração dos programas de intervenção em
situação de seca.
·
Deve ser
assegurada a disponibilidade da água para o abastecimento público e, em
seguida, para as actividades vitais dos sectores agro-pecuário e industrial.
A par desta conjuntura,
foi ainda publicada em 2007, durante a Presidência Portuguesa da União Europeia
a seguinte Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho: “Enfrentar
o desafio da escassez de água e das secas na União Europeia”. Segundo esta, o
mais importante é, sem sombra de dúvidas, melhorar a gestão dos riscos de
secas, através não só do desenvolvimento de planos de gestão dos riscos de
secas, como através da optimização da utilização do Fundo de Solidariedade da
UE. Para o ano de 2012, está ainda prevista uma revisão da política da União
Europeia sobre escassez e secas por parte da Comissão. A revisão da estratégia
para a escassez de água e secas, juntamente com a análise da implementação da
Directiva Quadro da Água e a análise da vulnerabilidade dos recursos ambientais
(incluindo a água) aos impactos das alterações climáticas, será integrada no
"Blue Print for Safeguarding European Waters".
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