quinta-feira, 19 de abril de 2012

Plano para uso eficiente de água


Em tempo de seca meteorológica em território continental, a tutela apresenta um Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água, dando um novo fôlego a uma estratégia que, apresentada há sete anos, nunca chegou a “sair da gaveta”. O planeamento assume importância vital para a agricultura nacional: o sector que consome a maioria de água e aquele que mais sofre diretamente com a falta de chuva.

Olha-se para o céu e desespera-se. A falta de chuva no horizonte tem levado à angústia os agricultores portugueses, neste cenário de seca meteorológica.
O Ministério da Agricultura, Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMOT) tem-se desdobrado em várias frentes. Por um lado, o anunciado Plano Nacional de Uso Eficiente da Água, cuja primeira versão encontra-se disponível desde o início de Abril. Por outro lado, a criação da Comissão da Prevenção, Monotorização e Acompanhamento da Seca (CPMAS), aprovada em Conselho de Ministros, a 15 de Março, e anteriormente, do Grupo de Acompanhamento e Avaliação dos Impactes de Seca 2012.




Seca extrema já atinge mais de metade do território nacional


A questão dos impactes das secas acaba por estar bastante entrecruzada com o uso eficiente de água e, consequentemente, com medidas de planeamento para os diferentes sectores. Neste aspecto, a tradição portuguesa não é famosa. Em 2005, foi aprovado em Conselho de Ministros o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água, que, desde então, nunca foi implantado. Desde 2001 que as 87 medidas contidas no plano para poupar água na agricultura, indústria e abastecimento urbano estavam definidas.
Um especialista da Universidade de Évora, Mário de Carvalho, denuncia a falta crónica de antecipação e planeamento. “Para minimizar os impactes da seca seria necessário um trabalho de planeamento que nunca foi feito. É essencial uma política geral de uso eficiente da água e de captações, algo que não temos”, afirma. “As lacunas de planeamento são especialmente graves, tendo em conta que, em média, há um ano de seca em cada dez”, lembra o docente e investigador. Mário de Carvalho foi um dos coordenadores do Sistema de Previsão e Gestão de Seca, desenvolvido através de uma parceria entre a Universidade de Évora e a Universidade do Porto, que avalia os impactes socioeconómicos nos diferentes sectores.
Para dar um novo fôlego às questões do planeamento, a tutela tem trabalhado no Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água. “Estamos a viver um período de seca, portanto é de todo apropriado e premente um planeamento de uso de água”, explicou o secretário de Estado do Ambiente, Pedro Afonso de Paulo. O responsável adianta que, para os vários sectores “as métricas e as eficiências são diferentes, mas que os objectivos sectoriais não serão compulsivos, mas indicativos”. A penalização do uso ineficiente da água e o alinhamento de uma série de incentivos para consumidores e entidades gestoras dos serviços urbanos serão um dos eixos principais de atuação da tutela.
A Federação Nacional de Regantes de Portugal (FENAREG) mostra alguma expectativa sobre este documento que há algum tempo está a ser apresentado. Como prioridade, a FENAREG apela à adequabilidade das medidas e à sustentação financeira do sector. “ O sector agrícola quer produzir mais e melhor, utilizando o recurso água de forma equilibrada”, diz a federação.

Sorvedouro de água

Na estratégia comunitária para melhorar a eficiência na utilização da água, a agricultura desempenha um papel crucial. Em Março, a Agência Europeia do Ambiente (AEA) divulgou o relatório “Towards eficiente use of water resources in Europe” (“Rumo ao uso eficiente dos recursos hídricos na Europa”), o primeiro de uma série de documentos sobre a temática, que serão apresentados em 2012. No relatório, a AEA expressa a sua preocupação pela falta de eficiência no sector agrícola e lembra que, na média europeia, a agricultura representa 33 por cento do consumo de água. Já nos países de Sul, a média aumenta drasticamente para 80 por cento.
As medidas propostas pela agência europeia vão desde melhorias tecnológicas na rega a políticas de preço que incentivem a eficiência. No primeiro lado da questão, é sugerido que os agricultores optem, cada vez mais, pela rega gota-a-gota, que é 90 por cento mais eficiente do que pela rega por aspersão. Além disso, “para a água usada na irrigação é necessária uma estrutura de preços que dê maiores incentivos para eficiência de recursos e que permita maior transparência em comparação com outros usos, para evitar a subsidiação cruzada de outras partes da sociedade”, defende a AEA.
Porém, a componente política não se esgota nos preços, estendendo-se também na integração entre sectores. No documento faz-se o apelo à integração de políticas nas áreas de gestão de recursos hídricos, agricultura, uso do solo e energias renováveis, tanto ao nível comunitário, como nos patamares inferiores de decisão.
Em Portugal, a agricultura assume-se como o principal consumidor sectorial de água, absorvendo cerca de 70 por cento das disponibilidades hídricas existentes. Segundo o censo agrícola de 2009, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o volume de água consumido para esse ano foi de cerca de 3,5 mil milhões de metros cúbicos. Por região, o Alentejo é a região com maior consumo de água (28 por cento), seguido do Ribatejo e Oeste (23 por cento) e do Entre Douro e Minho (16 por cento).
Tendo em conta este cenário, os especialistas não deixam de assinalar as melhorias no uso de água feitas pelo sector agrícola. “Indiscutivelmente que melhorou”, assegura Francisco Avillez, sócio-fundador da Agroges – Sociedade de Estudos e Projetos. O especialista, que é também coordenador do Grupo de Peritos para a Reforma da Política Agrícola Comum pós-2013, lembra a tendência de quebra do sector, que acaba inevitavelmente por resultar numa redução de água regada e numa maior concentração em áreas de maior rentabilidade. A juntar, a “melhoria significativa dos sistemas de rega” veio contribuir para uma maior eficiência no uso de água Muito embora “haja uma reconversão dos regadios públicos mais lenta do que se quereria que fosse”.
A FENAREG partilha da mesma visão. “Em Portugal, alguns sistemas de regadio têm registado evolução em termos de reabilitação e modernização, respondendo atualmente a mais elevados padrões de utilização de água, tempo e energia”, comenta a federação. Não obstante, a Federação de Regantes aponta o regadio como o caminho para uma maior eficiência no uso da água, aliada à garantia de competitividade da agricultura portuguesa. “Nesse sentido, é vital a reabilitação e modernização dos regadios públicos existentes, a construção de novos regadios e o apoio ao investimento dos agricultores para a renovação e aquisição de equipamentos de rega.” A federação sublinha ainda que Portugal está no mesmo patamar de eficiência no uso da água do que outros países com idênticas condições mediterrâneas, como Espanha, Grécia e Itália.


Somos da opinião que a questão do uso eficiente da água na agricultura tem de se voltar para os preços. A água tem um preço tão baixo que nem é contabilizada pelo agricultor como um custo de produção, dando lugar a um uso despesista do recurso.

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