terça-feira, 17 de abril de 2012

Direito de audiência


O princípio da audiência dos interessados surge no âmbito do procedimento de ambiente. (ocupar-me-ei apenas do direito à audiência sob pena de incidir sobre o tema de outra colega).
 No moderno Estado de Direito parece haver uma crescente preocupação com a “legitimação pelo procedimento”, na medida em que proporciona aos indivíduos e instituições a sua participação na tomada de decisões mais correctas por parte da Administração. O procedimento público é uma realidade multifuncional, na medida em que a par da sua dimensão objectiva (funções legitimadoras, organizatórias, participativas), reconhece uma dimensão subjeciva, na medida em que é um instrumento de garantia dos direitos dos particulares. A afectação dos interesses tanto pode resultar da subtracção de um direito, na imposição de uma obrigação ou na não atribuição de determinado benefício para o qual o sujeito é elegível. Para que o sujeito tenha o direito a ser ouvido tem de ser afectado juridicamente e não meramente de facto, sendo que direito à audiência não pode ser garantido a toda e qualquer pessoa, sob pena de uma maior lentidão e burocracia nos procedimentos, sem que a mais valia resultante da sua participação compense. Caso houvesse a extensão dos direitos procedimentais a todos os sujeitos que alegadamente fossem afectados pela decisão tornar-se-ia de difícil, senão impossível, a gestão do procedimento porquanto a administração ir-se-ia desdobrar em esforços de notificações, audições contraditórias o que  facilmente tornaria qualquer procedimento em procedimento de massas. A finalidade da audiência pública é assegurar a aplicação da democracia no Direito do Ambiente. A participação dos cidadãos nos procedimentos administrativos constitui uma exigência de uma Administração de umEstado de Direito,e por outro lado um direito fundamental dos indivíduos (art.267.º/5 CRP). O Código de Procedimento Administrativo consagrou o princípio de participação dos cidadãos e associações representativas dos seus interesses na formação das decisões conforme dispõe o artigo 8.º do código em causa, assim como um direito de audiência dos interessados, que pode ter lugar em qualquer fase do procedimento (art.59.º CPA), ou depois de concluída a instrução e antes de ser tomada a decisão final (art.100.º ss CPA). O direito à audiência, a formalidade em si, consubstancia uma verdadeira garantia jurídico-material. O direito a ser ouvido tem uma dimensão funcional que se traduz na contribuição do particular para o apuramento dos factos relevantes mas tem também uma dimensão garantística. Na primeira valoriza-se o facto de os particulares carrearem para o procedimento as informações necessárias à decisão com vista à sua instrução completa, através de um procedimento dialogante, favorecendo-se igualmente a legitimação das decisões. Na última concretiza-se a participação dos interessados enquanto indivíduos portadores de interesses próprios que importa salvaguardar no procedimento, permitindo-lhes que transmitam o seu ponto de vista sobre o caso em apreço, de modo a não os reduzir a meros objectos da actividade administrativa. Em qualquer das suas dimensões trata-se de um meio de que os particulares dispõem para desde logo controlar e influenciar a actividade da Administração. A audiência dos interessados tornou-se uma fase necessária de qualquer procedimento, cujo desvalor quando seja preterida é a invalidade. O Prof. Vasco Pereira da Silva considera que se trata de um vício do procedimento e não de forma, gerador de invalidade (e não anulabilidade como resulta da orientação tradicional). O professor regente vai ainda mais longe ao considerar que a não audiência do particular “poderia igualmente implicar uma ilegalidade material desse mesmo acto, por ter sido praticado sem a correcta ponderação de todos os valores envolvidos, o que originaria o “vício de violação de lei”, por violação do princípio constitucional da “protecção dos ditreitos e interesses legalmente protegidos” (vide os artigos 266.º/1 CRP e art.4.º CPA). Assim, a falta de audiência determina a nulidade da actuação administrativa, e a sua realização sem a correcta ponderação dos interesses em causa gera violação de lei, por violação do princípio constitucional de respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos pelos particulares. 
   O princípio da audiência prévia reflecte-se numa maior correcção e eficácia da actuação da Administração bem como numa maior e melhor tutela antecipada de direitos dos particulares.  O Procedimento de Ambiente é considerado um posto avançado de direitos, que tende salvaguardar os direitos em causa, e tendo em causa que o Ambiente é um direito fundamental (art.9.º alíneas d) e e), e art.66.º CRP), faz todo o sentido abordar o direito à audiência enquanto formalidade essencial do Procedimento de ambiente. Não está já em causa o dever do interessado em « prestar a sua colaboração para o conveniente esclarecimento dos factos e descoberta da verdade » ( Artº 60 , nº 2 CPA) , nem o poder discricionário da administração  de solicitar informações aos particulares ( Artº 89º , nº1 CPA) , mas a sujeição da administração ao dever de audiência dos interessados.

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