quinta-feira, 12 de abril de 2012

Direito Fundamental à água?

Na intervenção introdutória do prof. Jorge Miranda na conferência sobre direito da água, este levantou uma questão bastante pertinente que se prende com a admissão ou não do direito à água enquanto um direito fundamental. A sê-lo, através do art. 81º al. n) CRP, este seria considerado um direito fundamental de natureza análoga e estando portanto sujeito ao regime destes através da cláusula aberta do art. 17º.

Como todos sabemos, o corpo humano é composto entre 70 a 75 % de água, contudo, segundo dados da FAO em todo o mundo cerca de mil milhões de pessoas não têm acesso a água potável.
No Direito Internacional encontramos vários instrumentos jurídicos que referem a água. O mais antigo será talvez a Carta da Água de 6 de Maio de 1968. A primeira conferência internacional específica sobre a água apenas ocorreu contudo em 1977 na cidade Argentina de Mar Del Plata, seguindo-se em 1992 (antes da ECO/92) a Conferência Internacional sobre a Água e o Maio Ambiente, em Dublin.
Maior importância contudo tem o Fórum Mundial da Água, o último realizado na Cidade do México, em 2006, no seio do qual alguns autores[1] falam do surgimento do paradoxo hídrico internacional. Este paradoxo nasce o facto dos atores economicos conceberem a água como um recurso natural privado, enquanto que as ONG’s e os movimentos sociais tentam defender a dimensão de direito fundamental da água. Falam também cada vez mais na substituição do ouro negro, i.e. o petróleo, pelo ouro azul, a água, como recurso ameaçado e de vital importância para as comunidade humanas.
Ainda assim a água está ausente dos documentos internacionais de maior importância, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos[2] e do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. O único instrumento jurídico que o afirma é a Declaração Universal dos Direitos das Águas, que no seu art. 2º expressamente consagra a água como um direito fundamental do ser humano. Contudo trata-se de soft law, sem força obrigatória.
Sendo biologicamente indispensável e portanto uma condição prévia para o exercício de todos os outros direitos, deverá o acesso à água ser considerado um direito fundamental?
Daqui decorreriam várias consequências, como por exemplo em caso algum poderia uma empresa de águas (suja pública ou privada) proceder ao corte de água a qualquer particular por falta de pagamento e ainda que as discrepâncias das tarifas entre o litoral e o interior teriam que ser efectivamente eliminadas, sob pena de violação do direito à igualdade.
Um exemplo real[3]:
”Em azeitão, porque o consumidor reclamara da forma ínvia como a Águas do Sado, S.A., se eximia ao cumprimento de uma ordem do tribunal arbitral, a empresa suspendeu o fornecimento de água à família, em que se incluem dois menores de 10 e 13 anos, obviamente em idade escolar.” Será isto admissível?




[1] Por exemplo Erivaldo Moreira Barbosa num artigo em Direito ambiental: o meio ambiente e os desafios da contemporaneidade, editora fórum, 2010.
[2] No seio da qual apenas por intermédio do Direito à vida se poderá equacionar uma positivação do direito à água, ainda que com sérias dúvidas.
[3] Dado pelo dr. Mário Frota no nº 61 (Março de 2010) da Revista Portuguesa de Direito do Consumo

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