Primacialmente,
há que configurar o direito de acesso à informação na sua consagração no texto
constitucional. Este direito está contemplado no art. 268º/1 e 2 da CRP e
compreende uma dupla dimensão: subjectiva (nº1) consubstanciando o acesso à
informação condição essencial ao cidadão para que compreenda o fundamento e
limite dos seus direitos perante os poderes públicos, e objectiva (n.º2) dado
que da possibilidade de o cidadão se informar sobre os elementos do
procedimento depende a transparência da actuação administrativa (lato sensu),
sendo que nesta última dimensão se supera o dogma da actuação silente da
máquina administrativa e permite uma extensão da legitimidade, por possibilitar
o contraditório público.
Carla Amado
Gomes afirma que “quanto maior a difusão das qualidades do bem se revele, maior
deve ser o empenhamento do colectivo na sua preservação”[i],
fazendo a ponte para a tutela do acesso à informação ambiental, pelo que o
ambiente enquanto interesse público
indutor de solidariedade intergeracional com o fim de prevenção de
condutas potencialmente lesivas de bens fundamentais não pode passar à margem
da consagração de um especial dever de informação. A protecção ambiental, por
ser uma tarefa partilhada entre entidades públicas e privadas, traduz-se numa
dimensão impositiva (dever de protecção do ambiente) e em dimensões pretensivas
de natureza procedimental e processual. Em suma, e embora o direito à
informação ambiental não encontre consagração expressa no texto da CRP,
seguinda a posição do Prof. Jorge Miranda é possível inferir este direito a
partir dos preceitos constitucionais, nomeadamente dos artigos 9º/e), 66º,
20º/2, 37º, 48º, 268º/1 e 2 da CRP.
Também a nível
supra estadual, mormente europeu, se despoletou interesse na consagração deste
direito. A Comunidade Europeia consagrou formalmente este direito com a
directiva do Conselho 30/313/CEE de 7 de Junho. Também foi essencial o papel da
jurisprudência do TEDH que proferiu duas importantes decisões em 1990,
acrescendo que a doutrina viu nestas decisões uma forma de sustentar um
verdadeiro direito de acesso à informação ambiental, a que corresponde um dever
estadual de publicitar sempre que a informação tenha relevância generalizada ou
para um grupo numeroso de pessoas, ligando a jurisprudência ao art. 10 da
Convenção. Não obstante, em qualquer dos casos o direito à informação ambiental
não é consagrado de forma absoluta, sendo consagradas restrições ao mesmo (ex.
art. 3º/1, §1º
e nº2 da directiva 30/313/CEE). Adopta-se o princípio da proporcionalidade como
medida de controlo da restrição, impondo a ponderação no caso concreto dos
valores e interesses em presença.
A Convenção de
Aarhus, assinada a 25 de Junho de 1998, visa harmonizar os pressupostos de
exercício de três direitos: o direito de acesso à informação ambiental (art.4º
e 5º), o direito de participação em procedimentos tendentes à aprovação de
actividades específicas (art.6º) e de planos, programas e políticas em matéria
de ambiente (art.7º e 8º) e o direito de acesso à justiça (art.9º). A
Assembleia da República ratificou em 2003 e é criado um diploma por força da
transposição da directiva 2003/4/CE, que regula especificamente o acesso à
informação ambiental (Lei 19/2006, comummente denominada LAIA), que é lei
especial face à anterior lei de acesso aos documentos administrativos (Lei
65/93).
Regime da LAIA
O art.5º
dispõe sobre a necessidade de actualização da informação, dada a natureza
mutável do bem em causa. A informação deve ser veiculada sob a forma mais
acessível aos interessados. O nº3 deste artigo determina qual a informação a
compilar, com base nas suas alíneas, e o nº4 impõe a publicação anual do
relatório sobre o estado do ambiente. Existem duas modalidades de acesso à
informação sobre o ambiente: (i) a simples consulta de dados (ii) e a obtenção
documentada de dados informativos (art.6º/2 e 3 respectivamente). No caso de ii) a informação pode ser
requerida por qualquer pessoa sem que seja necessário esta justificar o seu
interesse ou legitimidade (art.6º/1), sendo que o requerimento será escrito no
qual devem constar as menções do art.6º/2 e a determinação precisa dos
elementos de informação pretendidos (art.8º), bem como o formato em que
pretende receber a informação (art.10º).
O prazo é de
10 dias para a satisfação do direito de obtenção de resposta ao pedido de
disponibilização de informação, seja essa resposta positiva (art.9º/1 al. a),
quando o pedido tenha como objecto informação que a autoridade pública em causa
deva ter tratada e coligida no âmbito das suas atribuições), ou negativa
(art.13º). Quando a autoridade pública não tenha a informação tratada e
coligida e ainda que o art.9º/1 al. b) aponte para o prazo de um mês,
entende-se que sobre a Administração impende sempre o dever de resposta, ainda
que suspensivamente, no prazo de 10 dias com o objectivo de clarificar o motivo
da dilação.
A resposta ao
pedido pode ser positiva, parcialmente positiva (art.12º), negativa, ou nenhuma
das três por força de o acesso à informação dever ser diferido para momento
posterior (art.11º/2 e 5). O nº6 do artigo 11º elenca os fundamentos de
indeferimento (paralelamente ao que acontece no art.4º/4 da Convenção de
Aarhus).
São ainda
previstas cláusulas de flexibilização dos fundamentos de recusa:
- O art.11º/7, que neutraliza o efeito fundamentante da recusa nos casos das alíneas a), d), f), g) e h), sempre que o pedido de informação se referir a fontes de emissões poluentes;
- O art.11º/8, que impõe a interpretação restritiva dos fundamentos de indeferimento e submete-los ao princípio da proporcionalidade;
- O art.12º, que estabelece o princípio da preferência da disponibilização parcial sobre a não disponibilização quando seja exequível distinguir entre os dados acessíveis e não acessíveis.
O art. 16º/1
da LAIA determina a gratuitidade da consulta junto da entidade pública
detentora da informação ou de listas e registos. Contudo, a disponibilização da
informação em suporte de informação pode ser taxada (art.16º/2), sendo que
quando o seja as organizações não governamentais do ambiente abrangidas pela
lei 35/98 gozam de isenção de 50% sobre essas mesmas taxas.
Quais os meios
de que o requerente dispõe quando a resposta ao pedido de aceso à informação
seja negativa, parcialmente positiva ou não tenha sequer lugar? Pode desde logo
reagir intra-administrativamente, apresentando uma queixa junto da Comissão de
Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), nos termos do art.16º da LADA
(Lei 65/93), no prazo de 20 dias sobre a notificação do indeferimento, do
diferimento parcial ou da passagem dos 10 dias sobre a apresentação do pedido.
A CADA dispõe de 30 dias para elaborar um relatório que deve comunicar a todos
os interessados, No âmbito deste relatório a Administração deve notificar o
requerente da sua decisão final, no prazo de 15 dias após a recepção daquele,
sob pena de se considerar que houve falta de decisão.
O requerente
que opte pela intervenção da CADA não prescinde nem vê precludido o direito de
accionar judicialmente o órgão faltoso, sendo o meio processual mais expedito
para o fazer a intimação para a prestação de informações, consulta de processo
ou passagem de certidões, regulada nos art.104º e ss do CPTA. Este é um
processo especialmente sumário que pode ou não ser acessório de uma acção
principal.
Em suma,
actualmente o direito à informação ambiental encontra consagração normativa
expressa no plano nacional e comunitário, espelhando a sua inegável relevância
no plano actual, possibilitando a sua sindicância administrativa e
jurisdicional.
LAIA -> http://www.dre.pt/pdfgratis/2006/06/113A00.PDF
[i]
In AMADO GOMES, Carla, “Textos dispersos de Direito do Ambiente”, vol. II, 1ª Edição, AAFDL, 2008
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