quarta-feira, 11 de abril de 2012

Direito à informação ambiental


Primacialmente, há que configurar o direito de acesso à informação na sua consagração no texto constitucional. Este direito está contemplado no art. 268º/1 e 2 da CRP e compreende uma dupla dimensão: subjectiva (nº1) consubstanciando o acesso à informação condição essencial ao cidadão para que compreenda o fundamento e limite dos seus direitos perante os poderes públicos, e objectiva (n.º2) dado que da possibilidade de o cidadão se informar sobre os elementos do procedimento depende a transparência da actuação administrativa (lato sensu), sendo que nesta última dimensão se supera o dogma da actuação silente da máquina administrativa e permite uma extensão da legitimidade, por possibilitar o contraditório público. 


Carla Amado Gomes afirma que “quanto maior a difusão das qualidades do bem se revele, maior deve ser o empenhamento do colectivo na sua preservação”[i], fazendo a ponte para a tutela do acesso à informação ambiental, pelo que o ambiente enquanto interesse público  indutor de solidariedade intergeracional com o fim de prevenção de condutas potencialmente lesivas de bens fundamentais não pode passar à margem da consagração de um especial dever de informação. A protecção ambiental, por ser uma tarefa partilhada entre entidades públicas e privadas, traduz-se numa dimensão impositiva (dever de protecção do ambiente) e em dimensões pretensivas de natureza procedimental e processual. Em suma, e embora o direito à informação ambiental não encontre consagração expressa no texto da CRP, seguinda a posição do Prof. Jorge Miranda é possível inferir este direito a partir dos preceitos constitucionais, nomeadamente dos artigos 9º/e), 66º, 20º/2, 37º, 48º, 268º/1 e 2 da CRP.

Também a nível supra estadual, mormente europeu, se despoletou interesse na consagração deste direito. A Comunidade Europeia consagrou formalmente este direito com a directiva do Conselho 30/313/CEE de 7 de Junho. Também foi essencial o papel da jurisprudência do TEDH que proferiu duas importantes decisões em 1990, acrescendo que a doutrina viu nestas decisões uma forma de sustentar um verdadeiro direito de acesso à informação ambiental, a que corresponde um dever estadual de publicitar sempre que a informação tenha relevância generalizada ou para um grupo numeroso de pessoas, ligando a jurisprudência ao art. 10 da Convenção. Não obstante, em qualquer dos casos o direito à informação ambiental não é consagrado de forma absoluta, sendo consagradas restrições ao mesmo (ex. art. 3º/1, §1º e nº2 da directiva 30/313/CEE). Adopta-se o princípio da proporcionalidade como medida de controlo da restrição, impondo a ponderação no caso concreto dos valores e interesses em presença.

A Convenção de Aarhus, assinada a 25 de Junho de 1998, visa harmonizar os pressupostos de exercício de três direitos: o direito de acesso à informação ambiental (art.4º e 5º), o direito de participação em procedimentos tendentes à aprovação de actividades específicas (art.6º) e de planos, programas e políticas em matéria de ambiente (art.7º e 8º) e o direito de acesso à justiça (art.9º). A Assembleia da República ratificou em 2003 e é criado um diploma por força da transposição da directiva 2003/4/CE, que regula especificamente o acesso à informação ambiental (Lei 19/2006, comummente denominada LAIA), que é lei especial face à anterior lei de acesso aos documentos administrativos (Lei 65/93).

Regime da LAIA

O art.5º dispõe sobre a necessidade de actualização da informação, dada a natureza mutável do bem em causa. A informação deve ser veiculada sob a forma mais acessível aos interessados. O nº3 deste artigo determina qual a informação a compilar, com base nas suas alíneas, e o nº4 impõe a publicação anual do relatório sobre o estado do ambiente. Existem duas modalidades de acesso à informação sobre o ambiente: (i) a simples consulta de dados (ii) e a obtenção documentada de dados informativos (art.6º/2 e 3 respectivamente).  No caso de ii) a informação pode ser requerida por qualquer pessoa sem que seja necessário esta justificar o seu interesse ou legitimidade (art.6º/1), sendo que o requerimento será escrito no qual devem constar as menções do art.6º/2 e a determinação precisa dos elementos de informação pretendidos (art.8º), bem como o formato em que pretende receber a informação (art.10º).

O prazo é de 10 dias para a satisfação do direito de obtenção de resposta ao pedido de disponibilização de informação, seja essa resposta positiva (art.9º/1 al. a), quando o pedido tenha como objecto informação que a autoridade pública em causa deva ter tratada e coligida no âmbito das suas atribuições), ou negativa (art.13º). Quando a autoridade pública não tenha a informação tratada e coligida e ainda que o art.9º/1 al. b) aponte para o prazo de um mês, entende-se que sobre a Administração impende sempre o dever de resposta, ainda que suspensivamente, no prazo de 10 dias com o objectivo de clarificar o motivo da dilação.

A resposta ao pedido pode ser positiva, parcialmente positiva (art.12º), negativa, ou nenhuma das três por força de o acesso à informação dever ser diferido para momento posterior (art.11º/2 e 5). O nº6 do artigo 11º elenca os fundamentos de indeferimento (paralelamente ao que acontece no art.4º/4 da Convenção de Aarhus).

São ainda previstas cláusulas de flexibilização dos fundamentos de recusa:
  1.           O art.11º/7, que neutraliza o efeito fundamentante da recusa nos casos das alíneas a), d), f), g) e h), sempre que o pedido de informação se referir a fontes de emissões poluentes;
  2.             O art.11º/8, que impõe a interpretação restritiva dos fundamentos de indeferimento e submete-los ao princípio da proporcionalidade;
  3.     O art.12º, que estabelece o princípio da preferência da disponibilização parcial sobre a não disponibilização quando seja exequível distinguir entre os dados acessíveis e não acessíveis.

O art. 16º/1 da LAIA determina a gratuitidade da consulta junto da entidade pública detentora da informação ou de listas e registos. Contudo, a disponibilização da informação em suporte de informação pode ser taxada (art.16º/2), sendo que quando o seja as organizações não governamentais do ambiente abrangidas pela lei 35/98 gozam de isenção de 50% sobre essas mesmas taxas.

Quais os meios de que o requerente dispõe quando a resposta ao pedido de aceso à informação seja negativa, parcialmente positiva ou não tenha sequer lugar? Pode desde logo reagir intra-administrativamente, apresentando uma queixa junto da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), nos termos do art.16º da LADA (Lei 65/93), no prazo de 20 dias sobre a notificação do indeferimento, do diferimento parcial ou da passagem dos 10 dias sobre a apresentação do pedido. A CADA dispõe de 30 dias para elaborar um relatório que deve comunicar a todos os interessados, No âmbito deste relatório a Administração deve notificar o requerente da sua decisão final, no prazo de 15 dias após a recepção daquele, sob pena de se considerar que houve falta de decisão.

O requerente que opte pela intervenção da CADA não prescinde nem vê precludido o direito de accionar judicialmente o órgão faltoso, sendo o meio processual mais expedito para o fazer a intimação para a prestação de informações, consulta de processo ou passagem de certidões, regulada nos art.104º e ss do CPTA. Este é um processo especialmente sumário que pode ou não ser acessório de uma acção principal.

Em suma, actualmente o direito à informação ambiental encontra consagração normativa expressa no plano nacional e comunitário, espelhando a sua inegável relevância no plano actual, possibilitando a sua sindicância administrativa e jurisdicional.


LAIA ->  http://www.dre.pt/pdfgratis/2006/06/113A00.PDF


[i] In AMADO GOMES, Carla, “Textos dispersos de Direito do Ambiente”, vol. II, 1ª Edição, AAFDL, 2008

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