terça-feira, 10 de abril de 2012

In dubio pro ambiente

In dubio pro ambiente

" Better safe than sorry", ou é melhor prevenir que remediar. Assim se inicia uma pluralidade de textos sobre o princípio da precaução. Este princípio é um dos mais recentes do Direito do Ambiente e leva a protecção do ambiente mais longe do que qualquer outro.

O princípio da precaução traduz-se na ideia de que o ambiente deve ter o benefício da dúvida quando haja incerteza, por falta de provas científicas, sobre o nexo causal entre uma actividade e um determinado fenómeno de poluição ou degradação ambiental. Por conseguinte, é possível falar-se a este propósito de uma espécie de "princípio in dubio pro ambiente", ou seja, na dúvida sobre a perigosidade de uma certa actividade para o ambiente, decide-se a favor do ambiente e contra o potencial poluidor. A aplicação deste princípio determina que o ónus da prova da inocuidade de uma acção com efeitos ambientais seja transferido do Estado para os potenciais poluidores.

Note-se, todavia, que não é possível apresentar uma definição rigorosa do princípio da precaução, uma vez que, se cada Estado é simultaneamente "legislador, administrador e julgador" deste princípio, o seu contéudo é moldável de lugar para lugar, de documento para documento.

A dúvida sobre a perigosidade de uma acção para o ambiente pode decorrer das seguintes circunstâncias:
- Ainda não se verificaram quaisquer danos decorrentes dessa actividade, mas receia-se, apesar da falta de dados científicos, que possam vir a ocorrer;

- Havendo já danos provocados, não há conhecimento científico de qual é a causa que está na origem dos danos;

- Ou ainda, apesar de haver danos, não há evidência científica da existência de nexo de causalidade entre uma causa hipotética e os danos.

Nestes casos, o princípio da precaução determina que, por motivos de segurança, as actividades suspeitas de terem provocado um dano, ou de poderem vir a provocá-lo, sejam interditas.

A era da globalização, ao mesmo tempo que trouxe desmedido progresso às ciências que estudam a natureza, acarreta problemas para o meio ambiente. A "sociedade de risco", que apresenta matizes de imprevisibilidade, incerteza e desconhecimento, é a responsável pela génese da ideia de precaução. Para Patrick de Araújo Ayala, a sociedade de risco é aquela em que é complexa a tarefa de apresentar soluções adequadas para o conflito entre o desenvolvimento tecnológico e a obrigação de estabelecer limites à própria capacidade de intervenção sobre o meio ambiente. E citando Beck: " O aumento das opções técnicas acarreta a incalculabilidade das suas consequências".

A vigência deste princípio (enquanto princípio autónomo) não é líquida na doutrina. Alguns autores entendem que consiste num princípio autónomo, ao passo que outros reconduzem-no ainda ao princípio da prevenção em sentido amplo.

David Freestone propõe a seguinte distinção entre Prevenção e Precaução: " Enquanto a prevenção requer que os perigos comprovados sejam eliminados, o Princípio da Precaução determina que a acção para eliminar possíveis impactos danosos no ambiente seja tomada antes de um nexo causal ter sido estabelecido com uma evidência científica absoluta". A pedra de toque da diferenciação entre os princípios em análise reside na extensão da atitude cautelar a riscos. Enquanto a prevenção lida com a mera probabilidade, a precaução ultrapassa-a, cobrindo a mera possibilidade e mesmo a descoberto de qualquer base científica.

A precaução, se interpretada num sentido radical, e se levada demasiado a sério, pode apresentar graves inconvenientes de ordem tecnológica, científica, jurídica, política, sociológica, económica e ecológica, como por exemplo os seguintes:
- Decidir uma questão a favor do ambiente é resolvê-la contra as expectivas de largas camadas de população;

- Os Estados podem ver restringidos os seus poderes soberanos de disposição e utilização de recursos naturais;

- O crescimento industrial, pecuário ou agrícola paralisa sem fundamentos científicos credíveis;

- O progresso científico estagna;

- O efeito lesivo não é absolutamente comprovável, devendo a convicção do juiz colocar-se para além de uma dúvida razoável.

O princípio da precaução, em toda a sua radicalidade, conduz à paralisia e mesmo à regressão.

Para evitar estes efeitos nocivos é necessário proceder a uma adopção de razoáveis medidas de cautela, tais como: a consagração dos deveres de informação, periódica revisibilidade de dados científicos, adopção de medidas preventivas aos deveres de comunicação de acidentes, etc.. É importante reconhecer a precaução como um princípio de acção e não somente de abstenção. Como qualquer princípio, a ideia de precaução não é absoluta e a sua aplicação depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a ameaça tem de ser sensível, isto é, perceptível ou apreciável; e o dano deve qualificar-se como sério (importância ou gravidade do dano possível) ou irreversível (inviabilidade de recuperação do meio ambiente ou do bem atingido).

É crucial agir, prevenindo. Desta forma, o princípio da precaução é um princípio a observar pelo poder público e pelos cidadãos.

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