quinta-feira, 19 de abril de 2012

Intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias



Debruço-me apenas na intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, prevista nos artigos 109.º a 111.º do CPTA, discutindo a sua eventual utilidade em matéria de ambiente.
Parece indiscutível que esta questão se relaciona com a concepção que adoptemos no que toca à natureza deste “direito ao ambiente”. É hoje pacífico na Doutrina que o ambiente é uma realidade que, efectivamente, o Direito valora e cuja protecção pretende assegurar. A questão passa antes por determinar se esse será um direito subjectivo; há autores que recorrem a uma noção ampla de ambiente, tratando-o como um direito de personalidade, como que uma extensão dos direitos à saúde e qualidade de vida, decorrência da defesa do livre desenvolvimento da personalidade, concluindo por uma defesa que se reporte à esfera individual dos cidadãos. (veja-se os Professores Vasco Pereira da Silva e Pereira Reis). No entanto, citando o Professor Menezes Cordeiro, que apresenta o direito subjectivo como a “permissão normativa específica de aproveitamento de um bem”, parece que não caberá aqui o direito ao ambiente, visto que não há uma fruição individualizada, configurando-se este como um bem colectivo, imaterial e inapropriável. Assim, deparamo-nos, de acordo com esta concepção, com uma impossibilidade de definir o conteúdo de aproveitamento individual deste direito, fazendo crer uma inclinação para a configuração deste “direito” como um dever de conservação, de promoção e manutenção do ambiente.
Transponho, assim, esta discussão para o âmbito da tutela cautelar. Nos termos do 109.º CPTA, ao intentar uma acção de intimação, o requerente tem direito de exigir uma conduta, de conteúdo que seja conforme à pretensão subjectiva que reclama. Ora, o problema reside exactamente aqui: ao aceitar que o direito ao ambiente se situa no plano dos interesses de fruição de bens colectivos, não há aqui nenhum direito a uma pretensão individualizada, mas somente um interesse de conteúdo subjectivamente indeterminável.
Tomando parte nesta controvérsia, parece-me que a construção do Professor Vieira de Andrade, ao ser mais protecionista dos direitos dos cidadãos, poderá ser útil nesta matéria. Parece que o Autor, em termos de legitimidade processual, tem um entendimento amplo, estendendo-a, além dos titulares dos direitos, liberdades e garantias, à acção popular (que também pode ser proposta pelo MP) em áreas que assumam relevo colectivo directo – onde caberá naturalmente o direito ao ambiente – desde que tal “respeite a disponibilidade legítima dos direitos pelos respectivos titulares”. Falamos, desta forma, da defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos, tal como resulta do 9.º/2 do CPTA.
No entanto, no lado oposto da Doutrina, cite-se a Professora Carla Amado Gomes que entende que, para o acionamento de uma intimação (uma vez verificados os pressupostos da urgência e indispensabilidade), teremos que estar perante uma pretensão individualizada, o que não é o caso.
Significa isto que não haverá tutela cautelar para a defesa do bem “ambiente”? Não, naturalmente. Para prevenir lesões a bens de “fruição colectiva” haverá sempre a possibilidade de utilização dos 120.º e 121.º do CPTA.
Admite-se ainda que esta intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias poderá tutelar mediatamente a questão ecológica, sempre que o requerente, ao obter procedência num processo de defesa do seu direito à integridade física e psíquica, obtenha, de forma reflexa, um resultado benéfico para o Ambiente, repondo o equilíbrio ecológico que fora afectado.

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