terça-feira, 22 de maio de 2012

A Floresta em Timor Leste e o papel da Cooperação Agrícola Portuguesa no seu Desenvolvimento

A economia de Timor Leste tem por base a componente rural e o sector florestal é reconhecido como um dos principais vectores para o seu desenvolvimento. Qual o papel que a Cooperação Agrícola Portuguesa pode desempenhar neste processo?


1. A FLORESTA EM TIMOR
Timor Leste é o país mais novo do mundo (2002) e um dos mais pobres, com a base da sua economia assente na componente rural (74%) (Atlas de Timor 2002), embora possua jazigas, tanto de petróleo como de gás natural, em número suficiente para tirar partido económico desses recursos, caso o permitam. Dentro do sector primário, a componente florestal é por demais reconhecida como um dos principais vectores para o desenvolvimento económico de Timor, embora a sua importância não se esgote ai, já que as suas funções ambientais, paisagísticas e protectora, nomeadamente das bacias hidrográficas, são de vital importância para Timor.
Desde tempos antigos, que Timor foi um país de imensos recursos florestais, nomeadamente dessa espécie conhecida como “petróleo verde” e que dá pelo o nome de sândalo (Santalum álbum). Relatos históricos, referem que a ilha foi descoberta pelos chineses no séc XIII e pelos portugueses em 1514, devido ao odor e perfume do sândalo. Outrora, a ilha do Crocodilo era constituída por uma imensa massa florestal onde na sua base estava o sândalo e que cobria quase toda a ilha. Numa carta de Rui de Brito para El Rei D.Manuel I, em 6/1/1514, refere “..he hua ylha alem de Java tem muytos sandallos..”. Mas, após a chegada destes e vendo ali uma riqueza natural quase inesgotável, começou a delapidação desse património florestal, particularmente nos séculos XVII e XIX, com a decadência económica de Timor que levou ao corte desordenado, provocado pelo comércio anárquico com Macau, China e Índia, chegando ainda no tempo dos portugueses (1925) a ser proibido o seu corte (Cinatti,1950). Com a invasão da Indónesia em 1975, o corte desta espécie foi quase total, estando hoje a ocorrência de sândalo reduzida aos distritos de Covalima, Lautém, Oecussi e Bobonaro. Devido à sua importância, esta espécie mereceu o primeiro inventário florestal (no distrito de Covalima e Bobonaro (ainda em curso)) por parte do Governo Timorense e os resultados são o que já se suspeitava: na sua generalidade as árvores tem diâmetros inferiores a 5 cm e que a percentagem de árvores com qualidade económica (>30cm) era inferior a 1%. (MAFF, 2004). No Distrito de Bobonaro, verificou-se um aspecto curioso, já que foi neste distrito que foram encontradas as melhores árvores, tendo sido primordial para a sua existência o facto de a Ai Kameli (sândalo) ser árvore lulik (sagrada) e ser portanto, proibido o seu abate (conversa pessoal com o Director das Florestas Timorense Mário Nunes, 2004).
A área florestal em Timor é estimada em 1.113.275 ha, representando 58% do território do país (MAFF,2004). A parte norte, mais seca, com pluviosidades de 500-1000mm, é composta por Ai mutin (Eucalitpus alba, Eucalipto branco) e sukaer (Tamarindus indicus, Tamarindo). A parte Este e Sul, com precipitações a rondar os 1500-2000mm, composta por Ai Kiar (Canarium reidentalia), Ai Na (Ptedocarpus indicus, Pau-rosa), Ai Saria (Toona sureni, "Red Cedar") e Ai Teka (Tectonia grandis, Teca). Nas partes montanhosas, onde as precipitações chegam a atingir os 3000mm é dominada pelo Ai Bubor (Eucaliptus urophyla, Eucalipto peto). Das espécies consideradas, com maior valor económico - Sândalo, Teca, Pau-rosa e Toona sureni - a Teca é a que apresenta mais significativas áreas (3500-4500ha), na sua maioria do tempo português. As restantes existem em pequenos bosquetes ou isoladas, também fruto da voracidade antropogénica, principalmente no tempo da ocupação. Hoje em dia, nas encostas predomina o eucalipto (branco e negro), sendo a sua utilização, maioritariamente, para lenha. 
2. PROBLEMAS QUE AFECTAM A FLORESTA
O estado em que se encontra hoje a floresta de Timor é grave. As razões não são nenhuma novidade, mas devido à complexidade dos problemas e à sua interligação as respostas e acções tardam a surgir.
Segundo o relatório “Forestry Management Policies and Strategies of Timor Leste”, Timor tem uma média anual de 1,1% de massa florestal perdida, quatro vezes maior do que a média global. Estes dados referem-se ao período entre 1972-1999, onde se perdeu 114000ha de floresta densa e 78000ha de floresta média, mas quem esteve em Timor após o referendo e a Independência (2002) sabe que estes números não desceram. Com esta devastação, também foram libertados da floresta e do solo 2,380.4 Gg de carbono. A desflorestação em Timor, associado a um regime de chuvas torrenciais e a uma topografia onde 41% da área total do pais tem declives superiores a 40% (Mota, 2002), bem como uma história geológica recente, causa gravíssimos problemas de erosão e perca de solos. Segundo Mota (2002), estima-se já que a perca de solo se cifra nas “26 toneladas por hectare e por ano (a média mundial é de cerca de 10 ton./ha/ano) que, a manter-se, conduzirá à ruptura do abastecimento de água, à baixa da sua qualidade e ao agravamento da sedimentação terrestre e marinha cuja dimensão dos prejuízos é difícil de quantificar em termos financeiros”. As causas desta enorme perca são a agricultura itinerante, as queimadas nas encostas na época seca, o consumo de madeira para o carvão doméstico, a construção de casas de habitação e, por fim, o corte ilegal de árvores, nomeadamente de sândalo, no distrito de Covalima a preços irrisórios (1kg a 5 USD), para Timor Oeste fruto de uma pobreza extrema.
O futuro não é risonho, já que o crescimento demográfico existente em Timor, particularmente após o referendo, com as famílias a possuírem em média 6 filhos, ou “os que Deus quiser”, aliado a um elevado grau de pobreza, nomeadamente nas terras altas de montanha, só levarão a uma pressão maior sobre as riquezas florestais, em busca de lenha e para construção de casas. Este fenómeno far-se-á sentir com mais intensidade junto dos aglomerados populacionais, locais para onde as populações se deslocam, em busca de mais e melhores oportunidades. Hoje em dia esse efeito já é por demais evidente em torno da capital, Dili.
Para resolver esta situação, Timor vai precisar da ajuda externa não só financeira como de formação técnica dos seus quadros, já que o insuficiente número (1 pessoa para 61,848 ha) e capacidade técnica dos seus recursos humanos são extremamente reduzidos. Aliados a estes factores, está uma Lei da Terra, que ainda não resolveu os limites das terras e quais os donos de muitas áreas, e uma inexistência gritante de dados, como tabelas de produção, entre outros para criarem planos de gestão, conservação e protecção dos seus recursos naturais, de preferência assentes numa plataforma sustentável.
3- ACÇÃO DO PADRTL EM TIMOR
O Programa de Apoio ao Desenvolvimento Rural em Timor Leste, existente desde Novembro de 2000, começou por intermédio do seu ex-Coordenador, Engº Nuno Moreira, a prestar mais atenção à floresta, nomeadamente aos sistemas agroflorestais de fins múltiplos, e a importância que estes têm na vertente ambiental, como regulador dos solos e das bacias hidrográficas, bem como paisagístico e económico, como elemento fundamental para a melhoria da rentabilidade das populações locais, inserindo-se ainda, num quadro mais alargado de desenvolvimento rural sustentável.
Assim, as duas Quintas existentes, em Aileu e Gleno, funcionam como pólos de formação e de produção de espécies florestais de elevado valor comercial, onde no topo das prioridades está sempre o sândalo, acompanhados pela Teca, Pau Rosa, Toona sureni e mogno, entre outras. Juntamente com estas, estão as espécies de elevado valor forrageiro, como o Ai Turi (Sesbania grandiflora), Caliandra (Caliandra calothyrsus), Ai Kafe (Leucaena leucocephala), que para além de fornecerem comida aos animais são espécies fixadoras de azoto e formam o mosaico agroflorestal, onde ainda se inserem as espécies fruteiras. Toda esta produção em série acaba nas populações onde se faz a distribuição das plantas, sem antes ter havido um programa de formação àquelas, como e onde plantar as árvores. Este programa é realizado pelas pessoas, timorenses, que trabalham nas Quintas que dão às populações toda a formação necessária. Pode-se afirmar sem pejo nenhum, que o PADRTL era o maior distribuidor de plantas em Timor, atingindo em 2003 a produção de 500000 plantas, nas quais 50000 eram sândalos. Aliás, pela extrema importância desta espécie, esta semente era adquirida a preços mais elevados pelo PADRTL, dependendo no entanto da sua qualidade. (5-10 USD/Kg.) O objectivo era não só preservar o reduzido material genético existente em Timor, bem como de tentar evitar o corte das árvores, e consequentemente o seu contrabando, proporcionando um meio de subsistência anual às populações.
As acções de formação que eram dadas, abrangiam muitos aspectos do ciclo florestal, desde a importância da colheita de semente, construção de viveiros, até à importância e execução das técnicas de preparação de terreno e de plantação, onde o uso do mulch (ramos de árvores, principalmente de forrageiras, colocadas nas caldeiras das árvores) como agente natural de protecção das culturas era referido em destaque.
Pequenos trabalhos de protecção de margens eram executados antes das épocas das chuvas, particularmente na Quinta Portugal, como função de monitorização e protecção das margens da ribeira que passava pela Quinta.
Por fim, algum trabalho cientifico, embora não fosse essa o principal objectivo era realizado, onde o “Estudo e Avaliação das Potencialidades da Teca em Timor Leste” teve o maior destaque. Este trabalho foi e está a ser executado por uma das entidades, Centro de Estudos Florestais, do ISA, na qual o PADRTL tem parcerias.

Referências
Cinatti, R. (1950). Reconhecimento em Timor. Relatório Final do Curso de Engº Agrónomo, Parte 1, ISA, Lisboa.
Department of Forestry and Water Resources (2004). Forestry Management Policies and Strategies of Timor Leste. Ministry of Agriculture Forstry and Fisheries (MAFF).
Faculdade de Arquitectura de Lisboa e G.E.R.T.I.L (2002). Atlas de Timor Leste. LIDEL, Lisboa,
Mota, F. (2002). Timor Leste: As novas Florestas do Pais. Ministério da Agricultura e Pescas, Direcção Geral de Agricultura, Divisão de Florestas.



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