A
questão que aqui se levanta é a de saber se faz sentido autonomizar o princípio
da prevenção, relativamente ao princípio da precaução ou, se pelo contrário,
devemos entender que um é sinónimo do outro.
Antes
de mais é necessário, explicitar o significado de prevenção e de precaução
neste âmbito. Como tal, prevenção significa “capacidade de antecipação de
situações potencialmente perigosas, de origem natural ou humana, capazes de pôr
em risco componentes ambientais, de modo a permitir a adopção dos meios mais
adequados para afastar a sua verificação ou, pelo menos, minorar as suas
consequências”, isto é, toma-se uma determinada atitude visando o afastamento
de riscos ambientais, antecipando as medidas que vão evitar as agressões ao
meio ambiente. A precaução diz respeito aos riscos desconhecidos provenientes
de determinados comportamentos adoptados pelo Homem que, justamente por estarem
para além da compreensão e do conhecimento humano, devem ser banidos, ou seja,
perante uma situação de incerteza científica de determinado actuação humana,
esta deve ser evitada, adoptando-se uma conduta “in dúbio pro” meio ambiente.
Muitos
autores, como por exemplo o Professor Gomes Canotilho,
defendem a separação entre o Princípio da Prevenção e o Princípio da Precaução,
porque acreditam que esta faz todo o sentido na medida em que, enquanto que,
numa situação de prevenção, previne-se
porque se sabe quais as consequências de se iniciar determinada atividade ou actuação,
de prosseguir com ela ou suprimi-la, cabendo, portanto, ao Administrador
Público ou à sociedade aceitar ou não o risco que oferece a actividade em causa,
conhecido depois de realizado o estudo de impacto ambiental.
Em suma, com a prevenção, é necessário conhecer
detalhadamente os riscos decorrentes da actividade que se pretende prevenir e com
a precaução, previnem-se os actos e as atividades cujas consequências e impacto
ambientais não se podem saber.
Existem, ainda, aqueles que negam a autonomia
do Princípio da Prevenção relativamente ao Princípio da Precaução, nomeadamente
o Professor Doutor Vasco Pereira da Silva que afirma que “é inadequado
distinguir prevenção e precaução em razão do carácter actual ou futuro dos
riscos, já que, no domínio das lesões ambientais, uns e outros se encontram
interligados, sendo necessário proceder à realização de juízos de prognose que
permitam considerar ambos simultânea e conjugadamente. ”
O Professor afirma ainda que não faz sentido
reconduzir a ideia de precaução a um princípio de “in dúbio pro natura” pois
isto levaria a que à inibição de
qualquer nova construção, mesmo que causasse um dano mínimo ao meio ambiente. O
Professor afirma ainda que, a aceitação da existência do princípio “in dúbio pro
natura”, se seria aceitável como “princípio de consideração da dimensão dos
fenómenos”.
Para o Professor, autonomização dos dois
princípios deve ser ultrapassada através da adopção de um conceito amplo de
PREVENÇÃO, segunda o qual, a prevenção tem por objectivo “afastar eventuais
riscos futuros, mesmo que não ainda inteiramente determináveis, de acordo com uma lógica
mediatista e prospectiva, tal como permite antecipar situações susceptíveis de
lesar o ambiente, quer sejam provenientes de causas naturais, quer de condutas
humanas”, que deverá incluir tanto a consideração de
perigos naturais e de riscos humanos, como a antecipação de lesões ambientais
de carácter anual como de futuro, sempre de acordo com critérios de
razoabilidade e de bom-senso.
Apresentadas as diferentes opiniões existentes
relativamente a esta questão, cabe tomar uma posição.
Do meu ponto de vista, o princípio da precaução
deve ser autonomizado em face do princípio da prevenção pois a lógica da
precaução conduz a uma tomada de decisão a favor da preservação do ambiente,
mesmo que isso contrarie interesses económicos.
Tendo em conta que os danos causados ao
ambiente são, na sua maioria, irreparáveis ou de reparação dispendiosa, o
princípio da precaução inverte a ideia de que para se restringir determinada
atitude deve provar-se que ela, efectivamente causa um dano. Basta, neste
âmbito, que se mostre a existência de indícios de dano.
É aqui que surge a ideia da inversão do ónus da
prova, de acordo com a qual, é ao titular de um comportamento, atitude ou
empreendimento que cabe mostrar a inexistência de riscos inerentes a esse
comportamento, atitude ou empreendimento.
Friso, no entanto que a aplicação deste
princípio deve ser conjugada com o princípio da proporcionalidade de modo a não
causar prejuízo ao desenvolvimento da economia e da tecnologia ou, até mesmo ao
bem-estar da população. A precaução pressupõe um juízo de valor sobre os factos analisados acentuando a
razoabilidade, ou seja, a investigação real de indícios razoavelmente fortes acerca
da existência de um dano para o ecossistema. Devemos recorrer a ela quando nos
deparamos com ameaças sérias e irreversíveis ao meio ambiente, que requeiram
uma acção para evitar tais ameaças mesmo que não exista, ainda, prova definitiva
desse dano.
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