terça-feira, 22 de maio de 2012


Princípio da Prevenção vs Princípio da Precaução


O princípio da prevenção é considerado como um dos princípios fundamentais do Direito do Ambiente e encontra-se consagrado no direito interno no artigo 66º nº2 a) da CRP e no artigo 3.º, a) da LBA (Lei de Bases Ambiental). Encontra-se ainda previsto a nível da U.E., no artigo 191.º, n.º 2 do TFUE. Já o princípio da precaução está previsto no artigo 191.º2 do TFUE, não tendo sido expressamente autonomizado a nível interno. Refira-se que estes princípios vinculam as instituições da União Europeia e os Estados Membros.

Discute-se na doutrina se o princípio da precaução deve ser autonomizado em relação ao da prevenção ou se deverá integrá-lo. Tem se vindo a defender uma distinção entre eles em abandono de uma concepção ampla do princípio da prevenção, acolhendo-se assim a concepção comunitária, mas tal não é pacífico.

Poderia dizer-se que o princípio da precaução teria como causa as lesões/possíveis lesões ao meio ambiente de origem humana, enquanto no princípio da prevenção a sua origem seria natural. No entanto, esta distinção já não faz sentido, pois o que distingue estes dois princípios são os conceitos de risco e perigo e não a origem dos mesmos. Neste sentido temos o artigo 196.º, n.º 1 do TFUE.

Como tal, o princípio da precaução trata dos riscos. Trata de afastar eventuais perigos futuros, que como tal não são ainda determináveis, independentemente da sua origem natural ou humana, segundo uma perspectiva de antecipação.

Estamos no campo do desconhecido em que não há certezas científicas ou suficiente informação, não se consegue estabelecer nexos de causalidade e como tal nem se sabe qual é a fonte da poluição. Assim, é um princípio que impõe moratórias, tem de se esperar até se obter informações suficientes, para nessa medida se irem tomando decisões adequadas. Trata-se de sincronizar o tempo, longo, da natureza, com a urgência do tempo do homem.

Já o princípio da prevenção trata dos perigos. Destina-se a evitar perigos imediatos e concretos e como tal conhecidos. Neste princípio integra-se, a título de exemplo, a avaliação de impacto ambiental.

Tendo em conta as definições feitas, é visível que cada princípio trata de uma realidade diferente ou ainda mais do que isso, cada princípio trata de tempos diferentes. Para além disso, cada vez mais o Direito da U.E. tem se “infiltrado” no Direito Interno dos Estados Membros e Portugal não é excepção. Como tal, na minha opinião, estes dois princípios devem ser autonomizados.

Segue-se assim a opinião de Gomes Canotilho, que também ele defende a autonomização do princípio da precaução face ao da prevenção por essa ser a ideia defendida no actual artigo 191.º do TFUE.

Neste sentido é ainda importante fazer referência que o Governo em comunicado dia 24 de Fevereiro de 2011 referiu que um dos pontos que consta da proposta de alteração da lei de bases do ambiente que irá ser apresentada é “(...) a autonomização do princípio da precaução face ao princípio da prevenção (...)”.

Já Vasco Pereira da Silva, defende a ideia que “ preferível à separação entre prevenção e precaução como princípios distintos e autónomos, é a construção de uma noção ampla de prevenção de modo a incluir nele a consideração tanto de perigos naturais como de riscos humanos, tanto a antecipação de lesões ambientais de carácter actual como de futuro, sempre de acordo com critérios de razoabilidade e de bom-senso”.


Para defender esta tese aponta argumentos de vária ordem:

• Elemento linguístico – No vocabulário português a distinção entre prevenção e precaução não existe, sendo expressões sinónimas. Esta distinção apenas fará sentido nos sistemas anglo-saxónicos, pois os termos prevention e precaution têm sentidos diferentes.

• Elemento material: Não considera adequado distinguir: prevenção em razão de perigos decorrentes de causas naturais e precaução em função de riscos provocados por acções humanas, uma vez que nas sociedades pós-industrializadas as lesões ambientais são o resultado de um concurso de causas em que não se afigura possível distinguir rigorosamente entre elas. Também não considera adequada a distinção em razão do carácter actual ou futuro dos riscos, uma vez que uns e outros se encontram interligados. O ónus da prova de que não vai haver nenhum risco, é excessivo “ não só em virtude do “risco zero” em matéria ambiental ser uma realidade inatingível, como também pelo facto de a consagração de tal exigência representar um factor inibidor de qualquer fenómeno de mudança, susceptível de se virar mesmo contra a própria tutela ambiental.

• Elemento relativo à técnica jurídica: O nosso ordenamento jurídico eleva o princípio de prevenção a princípio constitucional não se fazendo qualquer referência ao princípio da precaução.

                Sem se ser exaustivo, visto tratar-se de um comentário e não de um trabalho, fica patente que esta é uma temática que suscita divergências na doutrina e que na minha opinião os dois princípios devem ser tratados como princípios diferentes e que a proposta de alteração à Lei de Bases do Ambiente deveria ser tomada em conta. Não só porque materialmente faz mais sentido, como para ficarmos em consonância com o Direito da U.E.



Bibliografia:
·Canotilho, José Joaquim Gomes, “Tratado De Direito Do Ambiente”;
·Gomes, Carla Amado, “Tratado De Direito Administrativo Do Ambiente” volume I;
· Silva, Vasco Pereira Da, “Verde Cor De Direito, Lições de Direito Do Ambiente”.

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