domingo, 20 de maio de 2012

Meio Rural e Pressão Urbanística


Um dos vinhos portugueses mais afamados e com uma auréola quase mítica é o denominado e comumente conhecido por Carcavelos.

Produzido desde tempos remotos e historicamente a partir dos vinhedos plantados em terras das freguesias de Carcavelos, Parede, São Domingos de Rana e parte das freguesias de Alcabideche e Estoril e de Oeiras e São Julião da Barra, Porto Salvo e parte da freguesia de Paço de Arcos, pertencentes aos concelhos de Cascais e Oeiras, sofre influência de um clima mediterrânico temperado, sem grandes oscilações de temperatura devido à proximidade do mar, resultando num vinho licorosa de grande qualidade.

É, contudo, no século XVIII que ganha a sua verdadeira expressão e grangeia o seu mais forte reconhecimento. Muito fruto da intervenção e proteccionismo do Marquês de Pombal e Conde de Oeiras, José de Carvalho e Melo, que o produzia na sua quinta de Oeiras.

Nesta época o vinho era exportado em volume considerável para Inglaterra, era adicionado aos lotes do Vinho do Porto, como agente melhorador, e era servido e muito apreciado na Corte, tendo chegado mesmo a ser enviado por D. José I como presente de estado à Corte de Pequim.

Tão excepcionais qualidades foram reconhecidas oficialmente em 1907 e confirmadas em 1908, através da Carta de Lei de 18 de Setembro, na qual foram definidos os princípios gerais da sua produção e comercialização, demarcando a região e conferindo-lhe o direito à menção específica de “vinho generoso”.

Porém, tão grande qualidade e reconhecimento não impediu que este produto singular tivesse estado em risco de desaparecer por completo, fruto de um quase inconciliável contraponto entre o mundo rural e a pressão urbanística vivida nas últimas décadas, em particular a partir dos anos sessenta do século XX.

A grande procura de habitação alternativa à capital, fez com que os concelhos vizinhos de Oeiras e Cascais, e em particular as freguesias a que se encontra por lei confinada a produção do Vinho de Carcavelos, assistisse a um crescente e acelerado desenvolvimento urbanístico, com a procura desenfreada de terrenos para construção.

Toda esta faixa territorial que até então mantinha muito da sua ruralidade e ritmos de vida própria, assistiu a uma transformação profunda da sua malha urbana e das zonas de produção agrícolas tradicionais, que iam muito para além do Vinho de Carcavelos, e nas quais se incluíam com uma forte preponderância a hortícola e cerealífera.

Por força de tão grande e rápida transformação, com cedência do mundo rural à pressão urbana, o Vinho de Carcavelos viu-se confinado a escassos hectares de plantação existentes em pouco mais de duas ou três quintas existentes no concelho de Cascais e na Estação Agronómica Nacional, em Oeiras, em terras outrora pertencentes ao Marquês de Pombal.

Depois da grande ocupação dos terrenos com a construção e a expansão urbanística, começou a sentir-se uma verdadeira necessidade de conciliar os espaços urbanos com espaços verdes e com espaços de cariz genuíno e autêntico.

Neste sentido, as próprias autarquias locais começaram a desenvolver esforços nessa medida, sendo de realçar a intervenção que as câmaras municipais de Cascais e de Oeiras têm desenvolvido nessa matéria, sendo de salientar as medidas de apoio à conservação das áreas onde ainda hoje se continuam a colher as uvas que dão origem ao tão precioso néctar Vinho de Carcavelos.

Em Cascais lançam-se campanhas de apoio à produção e sensibilizam-se as populações e os mais jovens, em Oeiras protegem-se e alargam-se as áreas de plantação, remodelam-se instalações e adegas, divulga-se e sensibiliza-se, tudo numa interacção saudável entre o mundo rural e o desenvolvimento urbano, tentando colmatar assimetrias e prevenindo o futuro.

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