No nosso
ordenamento jurídico, o único meio jurisdicional específico existente para
tutela de direitos subjectivos em sede de Direito do Ambiente são os “embargos
de terceiro”. Está consagrado no artigo 42º da Lei de Bases do Ambiente (Lei
11/87, de 7 de Abril), embora de forma insuficiente, de acordo com a opinião do
Professor Doutor Vasco Pereira da Silva, que afirma que: “a consideração destes
embargos de ambiente como um verdadeiro meio processual é, em grande medida,
uma construção de juristas, já que a
regulação da Lei de Bases (…) é incompleta e insatisfatória” (Vasco Pereira da
Silva, Verde Cor de Direito – Lições de
Direito do Ambiente, 2002, Coimbra, Editora Almedina).
O artigo 42º
da Lei de Bases do Ambiente (LBA, doravante) dispõe que: “Aqueles que se
julguem ofendidos nos seus direitos a um ambiente sadio e ecologicamente
equilibrado poderão requerer que seja mandada suspender imediatamente a
actividade causadora do dano, seguindo-se, para tal efeito, o processo de
embargo administrativo.”.
Até às alterações realizadas à LBA em
2002, vários problemas de interpretação da natureza jurídica deste mecanismo
eram colocados pela Doutrina. O artigo 45º, nº 1 da mesma lei, estabelecia a
competência dos tribunais comuns para aplicarem este mecanismo. Tendo em conta
que “embargos administrativos” são da competência da Administração Pública e
não dos tribunais, como referia o Professor Doutor Freitas do Amaral existia uma
clara divergência entre o que estabelecia o artigo 42º e o que estabelecia o
artigo 45º. Embargos judiciais, esses sim, são da competência dos tribunais,
pelo que o Professor Doutor Vasco Pereira da Silva, defendia que nos encontrávamos
perante embargos judiciais pela clara intenção do legislador de que estes
fossem da competência dos tribunais. A expressão “embargos administrativos”
estava, portanto, incorrecta e não devia ser entendida de forma literal. O
Professor defendia que devia fazer-se uma correspondência entre este mecanismo
e um meio contencioso pré-existente que permitisse a tutela efectiva dos
direitos em causa.
Outro
problema colocado era o de saber se este meio processual pertencia ao
Contencioso Administrativo ou ao Processo Civil. O Professor Vasco Pereira da Silva
entendia que era o segundo, pois um meio processual do Contencioso nunca
poderia ser da competência dos tribunais comuns.
O último
problema que se colocava era o de se o meio seria uma acção principal ou um
procedimento cautelar. Aqui nesta questão, o Professor Pereira da Silva
considerava que era um procedimento cautelar, uma vez que a disposição legal
vinha referir que o pedido do partícula fazia suspender imediatamente a
actividade causadora do dano, o que demonstrava o seu carácter provisório.
Felizmente,
a redacção actual do artigo 45º, criada pelas alterações realizadas pela Lei
13/2002, veio retirar todas estas dúvidas, deixando claras as respostas a todas
elas. A redacção do artigo 45º, nº 1 e 2 é, hoje, a seguinte:
“Artigo 45.º
Tutela judicial
1 - Sem prejuízo da legitimidade de quem se sinta ameaçado ou
tenha sido lesado nos seus direitos, à actuação perante a jurisdição competente
do correspondente direito à cessação da conduta ameaçadora ou lesiva e à
indemnização pelos danos que dela possam ter resultado, ao abrigo do disposto
no capítulo anterior, também ao Ministério Público compete a defesa dos valores
protegidos pela presente lei, nomeadamente através da utilização dos mecanismos
nela previstos.
2 - É igualmente reconhecido a qualquer pessoa,
independentemente de ter interesse pessoal na demanda, bem como às associações
e fundações defensoras dos interesses em causa e às autarquias locais, o
direito de propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos
principais e cautelares destinados à defesa dos valores protegidos pela
presente lei.”
Da leitura
do preceito, retira-se a conclusão de que os esforços interpretativos da
Doutrina estão, face ao passado, facilitados. Quanto à primeira questão,
torna-se claro que estamos perante um meio jurisdicional e não uma forma de
actuação da Administração, por conferir a possibilidade de o particular
recorrer à “jurisdição competente”. Em relação à segunda questão, se o meio
processual seria de Contencioso Administrativo ou Processo Civil, conclui-se pela
leitura do nº 1 que é um meio contencioso, pois é o contencioso que permite ao
particular tutelar os seus direitos em matéria de Ambiente. Relativamente à terceira
e última questão, ficou claro no nº 2 que este meio processual tanto pode ser
uma acção principal como um procedimento cautelar.
Em
conclusão, embora continue a faltar regulação acerca dos “embargos
administrativos” de ambiente, pois os preceitos continuam a ter escassa
informação, os problemas mais graves de interpretação puderam ser ultrapassados
com a última alteração à LBA. Existe, portanto, ainda, algum défice de tutela
processual em matéria de Ambiente, sendo, muitas vezes, necessário recorrer a
formas de processo mais gerais de Direito Administrativo, como as acções de
impugnação de acto administrativo ou as intimações para protecção de Direitos,
Liberdades e Garantias.
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