sexta-feira, 18 de maio de 2012

Ponderação do interesse público no direito privado do ambiente


Há que reflectir qual o papel que a invocação de superior interesse público pode ter, no sentido dos efeitos de aplicação, de normas de Direito Privado do Ambiente. Esta discussão há muito que é tida em conta na jurisprudência portuguesa e objecto de diversos Acórdãos decorrentes dos tribunais portugueses. Cabe-nos, deste modo, fazer referência a algumas destas decisões que consideramos pertinentes.
O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 23 de Junho de 1998, chamou inicialmente a nossa atenção para esta problemática, a propósito da afirmação da evitabilidade da poluição por força do “estado civilizacional em que vivemos”, na fase do confronto entre o direito à saúde e a construção de uma auto-estrada junto à casa de morada dos Autores. Da leitura do Acórdão ressalva “ o interesse público evidente da existência destas vias de comunicação” sublinhado pelo tribunal. Contudo, note-se, que o tribunal nunca cita a relevância do interesse público para a decisão final, ou o papel que o mesmo tende a desempenhar. Ainda assim, e apesar de tal não se encontrar expresso no texto do Acórdão, ressalta da leitura do mesmo a prudência do tribunal no preenchimento dos pressupostos de que pendia a procedência do pedido. Por isso entendemos, que a relevância pública da decisão em causa, representou um papel muito mais relevante do que resulta da leitura do conteúdo da decisão. O que leva a questionar se tal prudência não pode ser fundada na ponderação do interesse público, superior aos interesses em causa. Outro caso, que apresenta manifesta importância na questão que nos cabe analisar, resulta do Acórdão de 11 de Maio de 2006 do Supremo Tribunal de Justiça. Ao concluir que “estando em confronto (sem que possam coexistir) - como direitos constitucionais e legais- o direito à vida e à integridade física de todos os que utilizam o edifício de um tribunal e o direito/dever de protecção de natureza, e mais concretamente (espécies de aves em estado selvagem), o direito de protecção das andorinhas que, desde há muito, nidificam neste último deve ceder e ser sacrificado perante aquele primeiro direito”, a decisão em causa foi mais assertiva na medida em que assumiu que havia um conflito. Na nossa prespectiva, configurou deliberadamente o interesse público em causa como um direito à protecção das andorinhas para potenciar a aplicação do artigo 335º do Código Civil, fazendo assim uma ponderação a título de colisão de direitos nos termos normais. Contudo, e uma vez mais, apesar do substrato material do Acórdão ser a limitação ou eliminação dos efeitos da aplicação de uma norma de Direito Privado do Ambiente, por força do prejuízo para o interesse público ambiental que a sua plena aplicação acarretaria, o tribunal volta a tentar a aplicação de outros institutos comuns de Direito Privado. Também o Acórdão de 1 de Março de 1994 do Tribunal da Relação do Porto, discorre longamente acerca dos problemas ambientais e sua compatibilização com o desenvolvimento económico, a propósito da relevância de uma estação de tratamento de resíduos. Este caso tem uma particularidade interessante: trata do conflito entre direitos de personalidade ambientais das pessoas que residiam perto do qual para qual estava ptojectada a estação e o interesse público ambiental de tratamento adequado de resíduos. Apesar do tribunal dedicar quase a totalidade do Acórdão à reflexão acerca de problemas ambientais, não retira depois dessa invocação qualquer consequência, uma vez que se limita a afirmar que não tinha sido feita prova suficiente para a procedência do pedido. A menos que se a aceite que não existe qualquer ligação entre o texto do Acórdão e a decisão final, cabe questionar então, qual a relevância que o interesse público desempenhou na decisão final.
As limitações de efeitos das decisões e efeitos suspensivos de actos por considerações de interesse público são frequentes e expressamente admitidas pela lei de processo nos tribunais administrativos (veja-se a este propósito as disposições contidas nos artigos 163º; 128º e 45ºdo CPTA), no entanto, não se quer com isto sugerir que o mesmo tratamento deva ser dado ao interesse público nos tribunais comuns. É natural que os tribunais e o contencioso administrativo tenham uma especial sensibilidade em relação às invocações de interesse público. Contudo a ponderação do interesse público pode ser enquadrado numa corrente de filosofia do direito que os nossos tribunais não parecem fazer uso adequado: a sinépica
Concluindo, “O Direito realiza-se em decisões concretas”, e a evolução do Direito e da teoria jurídica têm de ter sempre em vista a concretização e materialização. Por isso, considera-se como especialmente relevante a análise de decisões jurisprudenciais tendo em conta o caso concreto, e o conflito dos interesses envolventes na causa.  

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