segunda-feira, 14 de maio de 2012


"Direitos Humanos
ONGs protestam contra exclusão de conteúdo sobre direitos humanos do documento da Rio+20
Grupo prepara carta endereçada ao secretário-executivo da conferência e ao secretário-geral da ONU, Ban-ki Moon, denunciando retrocesso em conquistas firmadas na ECO-92
Márcia Régis

O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon


"Das cinzas da Segunda Guerra Mundial, a humanidade levantou instituições com o objetivo de construir a paz e prosperidade para todos, evitando mais sofrimento e destruição. A Declaração Universal dos Direitos Humanos difundiu essa vontade coletiva e a Organização das Nações Unidas foi criada para torná-la realidade. De forma alarmante, esta instituição está sendo usada como plataforma para atacar os mesmos direitos que deve proteger, deixando as pessoas sem defesa e colocando a relevância da ONU em jogo", diz trecho da carta
Na noite de domingo (25), um grupo de organizações não-governamentais de diversos países lançou uma carta de adesão para ser enviada nesta segunda-feira ao secretário-executivo da Rio+20, Sha Zukang, com cópia ao Secretário-geral da ONU, Ban-ki Moon, e a todos os representantes de Estados-Membros das Nações Unidas. Intitulada Rights at risk at the United Nations (Direitos em risco nas Nações Unidas), o documento manifesta repúdio aos cortes de conteúdo relativo a direitos humanos firmados há 20 anos no texto da Minuta Zero, a primeira proposta de conteúdo da declaração final da Rio+20. Organizações e redes que desejarem endossar a carta têm prazo até esta segunda-feira dia 26 de março, às 18h (horário de Nova York, que corresponde as 17h de Brasília).

Em um dos trechos do documento, ao qual o site de VEJA teve acesso, a credibilidade da ONU é questionada. "Das cinzas da Segunda Guerra Mundial, a humanidade levantou instituições com o objetivo de construir a paz e prosperidade para todos, evitando mais sofrimento e destruição. A Declaração Universal dos Direitos Humanos difundiu essa vontade coletiva e a Organização das Nações Unidas foi criada para torná-la realidade. De forma alarmante, esta instituição está sendo usada como plataforma para atacar os mesmos direitos que deve proteger, deixando as pessoas sem defesa e colocando a relevância da ONU em jogo."

Conheça a íntegra do documento, em inglês.

O primeiro dia oficial da agenda da 3ª Reunião Interseccional da Rio+20 foi pautado por um grande debate sobre alterações e até mesmo cortes de trechos de textos da Minuta Zero referentes a direitos humanos. A Minuta Zero é a primeira proposta da declaração final da conferência mundial de desenvolvimento sustentável que acontecerá em junho no Rio de Janeiro, com a presença confirmada de 80 Chefes de Estado.

“Está claro que a Rio+20 está sendo vista por alguns países como um trampolim para não honrarem compromissos firmados ao longo dos últimos 20 anos e, mais ainda, compromissos que estão sob a salvaguarda da própria ONU”, declarou Rubens Harry Born, diretor do Instituto Vitae Civilis e membro da Comissão Nacional Organizadora do governo brasileiro, como representante da sociedade civil. Em Nova York desde sexta-feira passada, Born falou ao site de VEJA, por telefone, na noite de domingo, ao fim do primeiro dia de trabalho na ONU.

Segundo ele, a Santa Sé excluiu da Minuta Zero os itens relacionados aos direitos sexuais reprodutivos. E os Estados Unidos rechaçaram os trechos relativos ao direito de acesso a água para todos – tema polêmico que envolve, entre outras questões, a possibilidade da privatização dos serviços de saneamento. Semana passada, no Dia Mundial da Água, celebrado em 22 de março, uma especialista da ONU da comissão de direitos humanos, já havia denunciado omovimento de diversos países alinhados às prerrogativas norte-americanas.

O acesso à água potável e limpa é um direito universal firmado na ECO-92, quando foi instituído o Dia Mundial da Água e uma comissão especial da ONU para cuidar do tema sob a égide dos direitos humanos. Durante todo o domingo, as organizações não-governamentais reunidas em Nova York debateram estratégias para sensibilizar o alto secretariado da ONU nos próximos dois dias, de modo que os compromissos firmados em conferências anteriores permaneçam no papel e avanços necessários ao momento atual (eficiência energética, por exemplo) ganhem mais relevância.

A Minuta Zero foi liberada em janeiro para negociações e dela se espera um Rascunho Um na próxima terça (27). O documento continha originalmente 19 páginas e já alcança 150. “Aqui está uma loucura: o que se define ao meio-dia, às seis da tarde caiu do texto ou já virou outra coisa”, resume Born.

O site de VEJA teve acesso a uma lista de trechos da Minuta Zero que estão sendo suprimidos ou colocados entre parênteses a pedido de diversos países. A 3ª Reunião Interseccional da Rio+20, iniciada oficialmente domingo, termina na terça-feira, 27, quando se espera o lançamento do Rascunho Um da conferência mundial que acontecerá em junho, no Brasil. A lista foi organizada em forma de manifesto pela ONG IBON International e foi disponibilizada pelo Instituto Vitae Civilis.

A seguir, os itens deletados da Minuta Zero ou com importância reduzida até o momento: 

SEGURANÇA ALIMENTAR

"Direito à alimentação e à nutrição adequada" (Excluído)

"Direito a todos a alimentos seguros, suficientes e nutritivos" (Perdeu importância e foi colocado entre parênteses)

"Atenção especial deve ser dada aos desafios enfrentados pelos pequenos produtores, mulheres e jovens, inclusive sua participação nos processos decisórios" (Excluído)

“Promover acesso à terra especialmente a mulheres, povos indígenas e outros grupos vulneráveis" (Excluído)

“Regulamentação dos mercados financeiros e de commodities para enfrentar a volatilidade dos preços” (Excluído)


ACESSO À ÁGUA

“Direito à água potável e saneamento adequado” (Excluído)

DIREITO AO DESENVOLVIMENTO

Todas as referências foram excluídas.

CLIMA

"Princípios do Poluidor-Pagador, Princípio da Precaução e da Responsabilidade Comum Mas Diferenciada." (Excluídas todas as referências ao comprometimento de países desenvolvidos com prestação de financiamento, transferências de tecnologia e capacitação de apoio aos esforços de desenvolvimento sustentável nos paises do Sul).


ERRADICAÇÃO DA POBREZA

Busca-se construir linguagem que privilegie apenas a pobreza extrema"


Crítica: Com a proximidade do Rio+20, muitos temas entram em pauta acerca da economia verde, dinheiro, investimento, política. Parece-me que há uma distorção em relação às prioridades no tratamento do meio ambiente como um direito de toda a humanidade. Comprova-se na notícia acima a pouca relevância com que os direitos humanos são tratados no universo das negociações internacionais, ficando em segundo plano, já que o mundo gira ao redor do capitalismo e do quanto se pode poluir mais, seja pagando, seja negociando. A consciência ecológica não existe nas pautas de reuniões, o que existe é a idéia do quanto podemos manter a economia em andamento, ganhando dinheiro com essa "história" de ecologia. Pouco se leva a sério que o planeta precisa ser cuidado para que não soframos mais com a poluição, o desmatamento, as mudanças climáticas, a extinção, dentre outros problemas ambientais. É tão ínfima a importância, que em uma reunião da ONU tão importante, vários direitos humanos foram retirados de negociação. Negocia-se a economia e a política, mas não o direito. Considerando que o direito do ambiente é a forma mais eficaz e justa de viabilizar  aplicação do direito de forma igualitária e equitativa, faz muito mal tratar a temática como esta ocorrendo. Estamos no cenário em que a água esta cada vez mais escassa, como retirá-la de um documento tão importante? Muitas pessoas estão passando fome, principalmente em países subdesenvolvidos, como os africanos, como fingir que a segurança alimentar não é fator relevante para discussão no Rio+20? A exclusão do direito do desenvolvimento é, em suma, o retrato de como os países desenvolvidos, ricos e ferazes pela temática economia, enxergam o planeta. Este não é tratado como um planeta de todos, mas sim como uma colcha de retalhos, dos quais alguns são persas, outros, são meras jutas. 

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