Segunda-feira sem carne
Um dia por semana sem comer
carne nem peixe para travar as alterações climáticas. A campanha Meatless Monday,
que mobiliza mais de 20 países, arranca em Portugal
A mudança de hábitos alimentares pode ter um grande impacto na
protecção ambiental, na saúde e na carteira. Uma campanha internacional,
iniciada nos EUA e agora em marcha em 24 países, apela ao corte do consumo de
carnes por um dia. Às segundas-feiras.
Paul McCartney e as filhas, Stella e Mary, são os rostos mais
visíveis destas Meatless Mondays, às quais já aderiram Bryan Adams, Sheryl
Crow, Gwyneth Paltrow e Kevin Spacey. «Estamos a dar grandes passos para a
redução dos problemas ambientais associados à indústria pecuária. Além de
darmos um impulso à saúde, com a vantagem adicional de que os vegetais custam
menos do que a carne», explica McCartney na página britânica do movimento (www.meatfreemondays.com).
A produção de carne disparou nas últimas décadas e é
insustentável manter padrões de consumo tão elevados. «A pecuária intensiva é
responsável por 18% da emissão de gases com efeito de estufa, como o metano,
que contribui para o aquecimento global 23 vezes mais do que o dióxido de
carbono. Cerca de 70% do solo arável mundial destina-se a alimentar gado e 70%
da desflorestação da selva amazónica deve-se à criação de pastagens e ao
cultivo de soja como ração», lembra Paulo Borges, mentor da iniciativa em Portugal.
Comer menos carne é uma das medidas mais rápidas e eficazes para
combater o aquecimento global, defendeu Rajendra Pachauri, Nobel da Paz e
presidente do Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas: «Há uma
grande emissão de gases com efeito de estufa no processo para se comer um bife,
que começa com o alto consumo de pasto e cereais e a água necessária para criar
uma vaca». Em declarações aos defensores de uma Segunda Sem Carne, no Brasil,
Rajendra referiu ainda os gastos de energia com as câmaras frigoríficas que
guardam este alimento e depois a despesa com o transporte e a própria
confecção.
Estudos mostram que a produção de um quilo de carne de vaca
liberta mais gases com efeito de estufa do que conduzir um carro e deixar todas
as luzes de casa ligadas durante três dias. São necessários entre 13 a 15
quilos de cereais e leguminosas, e 15 mil litros de água potável, para produzir
apenas um quilo de carne de vaca. A criação de animais para abate absorve
demasiados recursos, que podiam ser usados no combate à fome, advertem as
Nações Unidas.
Do slogan de guerra
à cozinha de chef
O mote Meatless Monday é o velho slogan usado nos Estados Unidos
durante a I Grande Guerra, que apelava à privação da carne à segunda-feira, a
par de outros racionamentos, num esforço para suportar as tropas
norte-americanas e apoiar a Europa, faminta e destruída.
Na época, cunharam-se moedas com este slogan, distribuíram-se
folhetos e livros de receitas com menus alternativos. Em 2003, o lema renasceu
em prol de uma vida mais saudável e em defesa do planeta. A cidade de Gent, na
Bélgica, foi a primeira a aderir oficialmente ao ‘dia vegetariano’, seguindo-se
São Francisco e outras localidades nos Estados Unidos.
A onda verde avança com chefs a reinventarem pratos irresistíveis
sem carne. _É o caso dos míticos Jamie Oliver e u_Mario Batali, que participam
no Meat Free Monday Cookbook, acabado de chegar às livrarias britânicas e
norte-americanas. O livro de Paul McCartney, escrito em colaboração com as
filhas, propõe um menu vegetariano completo para todas as segundas-feiras do
ano, com as receitas favoritas da família e contribuições de celebridades.
Em Portugal, Rui Reininho é uma das figuras públicas que apoiam
a campanha (www.2sem carne.com): «Há algum tempo que evito as
carnes vermelhas e brancas; não são uma boa energia para mim. E ao domingo e à
segunda-feira procuro fazer uma espécie de desintoxicação. Nada que os
católicos não façam há muito, com o jejum e a abstinência», comenta o músico.
Quando era criança, Reininho acompanhava a mãe e o padrinho no
trabalho e diz que foi criado a visitar matadouros e feiras de gado. «Sei o que
isso representa ainda nos meus pesadelos», conta.
A actriz Sandra Cóias há muito que aplica os preceitos do
vegetarianismo: «Não compreendo como o ser humano é capaz de criar e abater os
animais de forma brutal. Mal tive a noção de que era possível viver sem os
incluir na minha alimentação, decidi de imediato fazê-lo».
O guitarrista Joel Xavier e o coreógrafo César Augusto Moniz são
outros dos nomes que apoiam a iniciativa, dinamizada pelas associações
vegetarianas portuguesas e pelo PAN, o Partido pelos Animais e pela Natureza.
Proteínas a mais,
saúde a menos
A carne e o peixe não são obrigatórios no prato, «menos ainda a
todas as refeições e nas quantidades exageradas a que estamos habituados»,
reconhece a nutricionista Inês Gil Forte. A própria dieta mediterrânica vai
mais longe do que esta campanha ao recomendar carne branca ou peixe «apenas
duas vezes por semana e carne vermelha menos de uma vez por mês. Quanto aos
ovos, até quatro por semana». As refeições devem girar «em torno dos produtos
hortícolas», defende a nutricionista, «da combinação de cereais e leguminosas,
que têm uma excelente concentração de aminoácidos».
Voltar ao arroz com feijão, às saladas de grão, às lentilhas e
optar por cereais integrais e frutos secos é uma boa escolha à mesa.
«Ainda persiste a ideia de que apenas comendo grandes quantidades
de carne ou peixe se consegue obter a proteína necessária e ter saúde, o que
não é, de todo, verdade», assegura a nutricionista. Cada vez mais, a carne
surge associada ao risco de desenvolver doenças cardíacas e vários tipos de
cancro.
A campanha Segundas Sem Carne sai à rua com sugestões de
receitas, alertando para «o impacto que o consumo excessivo de carne tem sobre
a saúde humana, o ambiente e os animais».
Nas palavras de Mc- Cartney, «esta é uma mudança significativa
ao alcance de qualquer um». Adiar a decisão? Até quando?
Fonte: online@sol.pt
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