domingo, 20 de maio de 2012

O Crime de Poluição – Artigo 279º Código Penal



O Crime de Poluição – Artigo 279º Código Penal

O crime de poluição visa proteger e preservar o ambiente enquanto bem jurídico autónomo. A proteção conferida ao ambiente, com a criminalização de determinados comportamentos, não se traduz numa prevenção de bens pessoais como a vida ou a integridade física. O que se visa realmente preservar, é um meio de vida são, com a proteção imediata de valores ambientais essenciais à plena realização da personalidade de cada homem. É por esta razão que a proteção do direito a um ambiente sadio pertence ao Direito Penal. 

O artigo 66º da CRP é dinâmico, tem evoluído consoante a ciência, o que nos leva a afirmar que neste momento estamos perante uma noção antropocêntrica moderada do meio ambiente rejeitando a ideia de fundamentalismo ecológico, uma vez que é compatível com outros direitos, tais como, a propriedade e a livre iniciativa económica, é esta também a posição de VASCO PEREIRA DA SILVA.         
 
No fundo, o que se visa proteger são os ataques que ponham em causa os níveis de tolerabilidade comunitariamente suportáveis, o que vai de encontro à ideia de ambiente sadio atrás referida. 

Quanto ao tipo objetivo, diferentemente dos crimes do Capitulo III do Código Penal, o crime de poluição confunde-se com o resultado. O comportamento proibido é poluir, desde que daí resulte como consequência uma poluição em medida inadmissível. É também, um crime de resultado de forma livre na alínea a) do art. 279º - “por qualquer forma” – e um crime de forma vinculada nas alíneas b) e c) do mesmo artigo uma vez que a poluição tem de ser efetuada mediante meios previstos no tipo. De notar a diferença de regime entre Portugal e Espanha quanto a esta matéria. Enquanto Portugal coloca a tónica da incriminação no resultado – “poluição em medida inadmissível” – Espanha no seu art. 325º prevê exaustivamente as condutas potencialmente lesivas, o que o torna um artigo redundante. 

Analisando o conceito de poluir previsto no Código Penal parece-nos que se deve optar pelo significado de poluir na linguagem corrente. Assim, poluição é o fenómeno de alteração dos elementos naturais do meio ambiente, de tal forma que a sua composição ou o seu estado ficam alterados, temporária ou irreversivelmente, deixando de ser adequados para a utilização que poderiam ter no seu estado natural anterior à atividade poluidora. 

Do ponto de vista penalista, a poluição criminalmente relevante, é apenas aquela que provoca a alteração dos elementos naturais em medida inadmissível, afastando-se desde já a ideia de que a toda e qualquer pequena alteração caberá a respetiva punição. No fundo, as propriedades dos elementos ambientais tutelados pelo crime de poluição – a qualidade da água, solo, ar ambiente sonoro – têm que ser alteradas de forma inadmissível. A definição do 279º/3 faz depender a relevância típica da ação do facto de constituir, também, uma infração do ordenamento jurídico-administrativo regulador da área em que se realiza essa conduta. Essa circunstância levou autores como JOSÉ DE SOUTO MOURA a afirmar que a medida inadmissível do nº1 do art. 219º CP tem a ver com a inobservância de prescrições ou limitações impostas pela administração, ou seja, o crime não existe quando há poluição ou quando a poluição é grande, existe apenas quando há poluição mais a inobservância das prescrições ou limitações da Administração. Esta solução aparentemente paradoxal poderá conduzir ao seguinte resultado: pode haver poluição reduzida e haver crime – porque a Administração interveio; pode haver poluição elevada e não haver crime – a Administração não interveio. 

O pressuposto de a conduta ilícita ter infringido uma norma administrativa, ou seja, extra penal, consubstancia o recurso à técnica da norma penal em branco. Esta remissão para disposições regulamentares levantou na doutrina enormes divergências que aqui não cabem tratar, contudo, será pertinente atentar na opinião de RUI CARLOS PEREIRA que sustenta estarmos perante uma conceção de crime de poluição como uma “desobediência de duplo grau”, uma vez que se exige não só que o agente viole disposições legais ou regulamentares, mas também, cumulativamente, seja advertido por uma autoridade competente de que é punível por desobediência. Consequentemente, o mesmo autor defende que esta norma pode criar enormes injustiças relativas, uma vez que a existência de crime dependerá da sensibilidade ecológica de cada autoridade administrativa. 

Contudo, e apesar da remissão para normas regulamentares, no caso em apreço, o artigo 279º contém o critério de ilicitude, orientando suficientemente os destinatários da norma para que possam compreender em que consiste a conduta proibida, não deixando a descoberto qualquer elemento do tipo de crime, uma vez que as “prescrições ou limitações impostas pela autoridade competente em conformidade com disposições legais ou regulamentares” desde que não consubstanciem nenhum critério autónomo de ilicitude, limitando-se a uma mera aplicação de conhecimentos técnicos não fere o princípio da legalidade. No fundo, o que a norma administrativa não pode fazer é “emprestar carácter inovatório na definição de elementos relevantes do próprio tipo de crime”.

Finalizando, ocorrerá “poluição em medida inadmissível” quando de uma determinada conduta resulte uma perturbação, uma contaminação, uma alteração significativa de pelo menos um dos elementos naturais do ambiente – água, solo, ar e ambiente sonoro – a tal ponto que ponha em concreto perigo a capacidade de recuperação dos sistemas naturais, o que nos leva a afirmar que com este critério os atentados mais graves são evidentes por qualquer homem médio, uma vez que o seu desvalor ético-social será de tal ordem que o individuo não terá, em principio, de conhecer qualquer norma técnica para saber que está errado e estar consciente da sua gravidade.

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