terça-feira, 8 de maio de 2012

Seguros Ambientais


Quanto maior é o desenvolvimento social e económico e a complexidade das atividades produzidas pelo Homem, maior é o seu dano e o seu impacto no ambiente. Contudo, o Homem não pode viver sem um ambiente minimamente sustentável. É neste ténue equílibrio entre progresso e proteção ambiental que devem ser euqcionadas formas eficazes de garantir tanto a proteção do meio ambiente como o ressarcimento de eventuais danos que venham a ser provocados. Se é verdade que a terefa de proteção ambiental é uma tarefa fundamental do Estado, a verdade é que este não é um único responsável pela sua preservação. Os próprios indíviduos o são e, por isso, uma possibilidade a ter em conta é garantir a defesa da sua atuação também através do Direito Privado, especialmente o direito civil e os seus mecanismos de responsabilização.

Importa pois problematizar a questão dos seguros ambientais: que realidades cobrem ou deveriam cobrir, quais as dificuldades com que as seguradoras se deparam com as apólices de seguros ambientais e principalmente averiguar se os seguros podem ter algum papel na proteção do meio ambiente.

Esta problemática só começou a ser considerada a partir da década de 80 (talvez também por ter sido a altura em que se começou a tomar maior consciência sobre as temáticas relacionadas ao ambiente) e as primeiras concessões iniciaram-se nos EUA. É de especial necessidade prever um mecanismo que cubra os danos causados pela poluição, só que esses danos podem derivar, fundamentalmente, de dois tipos de poluição:

  1. por um lado, uma poluição súbita e acidental, provocada por um evento ou uma catástrofe inesperada;
  2. por outro, uma poluição gradual, em que o processo destrutivo se prolonga durante um determinado périodo de tempo.
A ocorrência de sinistros de grandes proporções ambientais, como derramamento de petróleo, levou a que, numa fase inicial, as seguradas excluíssem, à partida, qualquer tipo de cobertura de reclamação de danos ambientais. Mais tarde é que se foi introduzindo a ideia de que deveria haver uma proteção, pelo menos, para os danos provenientes de um evento súbido ou acidental (claro que é legítimo questionar se só esta proteção em termos de seguro é suficiente, uma vez que também podem existir danos provenientes de processos de poluição gradual, como vimos).

À partida, parece estar definitivamente excluída do âmbito do seguro aquela poluição típica decorrente do normal funcionamento das instalações, isto porque é praticamente impossível eliminar todo o tipo de emissões delas provenientes, até porque a função do seguro é a de cobrir acontecimentos fortuitos e não certos. Assim sendo, a poluição normal e inevitável proveniente de uma certa atividade, é, em princípio, insegurável.

Em outros países, a cobertura para o risco de poluição encontra-se limitada apenas a acidentes ou descargas repentinas, remetendo então para o tipo de poluição súbita ou inesperada de que falámos acima, sendo portanto de excluir do âmbito das suas apólices os danos causados por acumulações graduais (apesar de alguns países, como Itália, França, Alemanha, EUA ou Suécia, cobrirem este último tipo embora com variantes e condições mais ou menos abrangentes). Devido a esta restrição operada pelas seguradoras quanto ao tipo de poluição que cobrem, muitas vezes tem se ido um pouco longe demais lá fora, especialmente nos países anglo-saxónicos, quanto à interpretação a dar às cláusulas do contrato de seguro, interpretação essa que não tinha sido equacionada aquando da sua elaboração. A título de curiosidade, por exemplo, tem se entendido nos tribunais americanos a equivalência entre as expressões “sudden” e “unexpected”, o que leva a que, mesmo em relação a danos graduais (que não estavam cobertos pela apólice), desde que se sustente que a sua manifestação ou perceção foi súbita, então, mesmo as suas consequências sendo graduais, estariam cobertas pelas apólices. É de louvar o esforço, mas parece-me que talvez seja ir um pouco longe demais na extensão dos conceitos, parecendo que se quer procurar, a qualquer custo, um culpado.

Para além deste problema do tipo de poluição e dos danos causados abrangidos pela apólice de seguro, também nos podemos questionar se as apólices abrangem só sinistros ocorridos durante a sua vigência. É que, muitas vezes, pode dar-se o caso de ser difícil determinar o exato momento da ocorrência do acidente, especialmente em casos de contaminações de origem antiga (“contaminações históricas”) que só se revelam mais tarde ou resultantes de causas cientificamente ainda desconhecidas... Se é fácil partirmos logo para a defesa do ambiente, também devemos equacionar o lado das seguradoras: como é que podem calcular o montante das provisões a constituir para fazer face a sinistros se a causa potencial ainda é ignorada pela ciência? Como mensurar financeiramente os seus efeitos?

Uma coisa é certa, é de excluir também o caso das contaminações históricas das apólices porque não faz muito sentido cobrir danos do passado em relação aos quais é difícil ou até impossível identificar quem foi o responsável pelos mesmos.

Outra questão que também se pode colocar é a de saber se podemos responsabilizar um empresário ou produtor diligente que cumpre todas as normas e regulamentações impostas num dado momento e que, posteriormente, podendo até ser fruto dos avanços científicos e tecnlógicos, se descobrem daí derivados danos imprevisíveis. É verdade que temos de ter em consideração quais eram os meios técnicos e científicos disponíveis nessa altura, contudo também temos de ter em atenção que, cada vez mais, o domínio ambiental torna-se um campo fértil para a chamada responsabilidade objetiva: é que por força de praticar certas atividades perigosas ou de impacto ambiental forte, a responsabilização pode continuar a ter ligar, independentemente do cumprimento normativo.

É à luz desta ideia de “risco” presente em certas atividades, sobretudo na área ambiental, que acabam por ter consequências ao nível da contaminação e dos danos ambientais, que surgem os seguros obrigatórios. De facto, certas atividades profissionais representam um risco implícito para terceiros e para o meio ambiente e, por esse motivo, devem ser garantidas por um seguro de responsabilidade civil ou então uma qualquer garantia financeira que confira a possibilidade de um ressarcimento rápido e eficaz do dano. São exemplos de seguros obrigatórios os seguintes normativos:

- Decreto-Lei 296/95, art. 6º referente a transferência de resíduos;

- Decreto-Lei 3/2004, art. 62º;

- DL 69/2003, artigo 5º que remete para a portaria 1235/2003 (alterada pela portaria 1058/2004) – artigos 3º e especialmente artigo 9º, que estabelece as exclusões quanto à abrangência do seguro.

No entanto, sem querer entrar em considerações excessivas sobre o assunto, gostava apenas de referir que, da perspetiva das seguradoras, esta questão da existência de um seguro obrigatório é mal encarada. Utilizam vários argumentos especialmente dizendo que se trata de um instrumento ineficaz devido à sua pouca aceitação, os riscos são variados devido à diversidade de atividades industriais e serviços que podem produzir danos e que, por isso, não há homogeneidade no estabelecimento de parâmetros de cobertura adequados e uniformes, não cabe às seguradoras controlar o cumprimento de normas ambientais mas sim ao Estado, o próprio mercado encarrega-se de desenvolver técnicas mais criativas e adequadas, porque livres e criadas pelas próprias partes, etc.

Não é alheio também o facto de questões de danos ambientais provocarem grande reação na opinião pública, devido à crescente valorização das questões ambientais e da sua divulgação. Ora, tudo isto pode vir a ter reflexos nos valores das indemnizações, o que pode explicar também a posição desfavorável das seguradoras quanto ao seguro obrigatório.

No meu entender, é verdade que é ao Estado que incumbe a principal fatia de prevenção e proteção do ambiente, tentando eliminar potenciais riscos ambientais. Às seguradoras não cabe eliminar esses riscos, pois eles não estão dependentes da sua ação enquanto tal. Cabe isso sim transferir eventuais custos que coubessem às instalações responsáveis pelos danos e essa transferência pode trazer benefícios ambientais. É que, passando este risco para as seguradoras, estas terão de desenvolver uma atividade de prevenção e de fiscalização de forma a evitar que se produzam danos – o que vai beneficar o meio ambiente. Além do mais, para além desta função de “incitação à prevenção”, as seguradoras são também as garantes face a danos ambientais.

Pelos exemplos dados em relação ao seguro obrigatório, especialmente o último exemplo, conclui-se que há uma tendência de implementação do mesmo quanto a atividades potencialmente perigosas, só que sofre de alguma ineficácia. É que se por um lado obriga à existência do seguro, por outro esvazia o seu conteúdo útil através das várias exclusões (artigo 9º da portaria 1235/2003) que faz. Vemos a vantagem da existência de seguros obrigatórios no sentido de incrementar e fortalecer cada vez mais a consciência de proteção ambiental, no entanto as exceções não podem ter maior abrangência do que a regra... Finalmente, em jeito de conclusão, também nos devemos perguntar se toda a responsabilização de um dano recai só sobre as seguradoras... Afinal importa só intervir na reparação do dano, ou, pelo contrário, evitá-lo em primeiro lugar?

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