Quanto maior é o desenvolvimento social e económico e a
complexidade das atividades produzidas pelo Homem, maior é o seu
dano e o seu impacto no ambiente. Contudo, o Homem não pode viver
sem um ambiente minimamente sustentável. É neste ténue equílibrio
entre progresso e proteção ambiental que devem ser euqcionadas
formas eficazes de garantir tanto a proteção do meio ambiente como
o ressarcimento de eventuais danos que venham a ser provocados. Se é
verdade que a terefa de proteção ambiental é uma tarefa
fundamental do Estado, a verdade é que este não é um único
responsável pela sua preservação. Os próprios indíviduos o são
e, por isso, uma possibilidade a ter em conta é garantir a defesa da
sua atuação também através do Direito Privado, especialmente o
direito civil e os seus mecanismos de responsabilização.
Importa pois problematizar a questão dos seguros ambientais: que
realidades cobrem ou deveriam cobrir, quais as dificuldades com que
as seguradoras se deparam com as apólices de seguros ambientais e
principalmente averiguar se os seguros podem ter algum papel na
proteção do meio ambiente.
Esta problemática só começou a ser considerada a partir da década
de 80 (talvez também por ter sido a altura em que se começou a
tomar maior consciência sobre as temáticas relacionadas ao
ambiente) e as primeiras concessões iniciaram-se nos EUA. É de
especial necessidade prever um mecanismo que cubra os danos causados
pela poluição, só que esses danos podem derivar, fundamentalmente,
de dois tipos de poluição:
- por um lado, uma poluição súbita e acidental, provocada por um evento ou uma catástrofe inesperada;
- por outro, uma poluição gradual, em que o processo destrutivo se prolonga durante um determinado périodo de tempo.
A ocorrência de sinistros de grandes proporções ambientais, como
derramamento de petróleo, levou a que, numa fase inicial, as
seguradas excluíssem, à partida, qualquer tipo de cobertura de
reclamação de danos ambientais. Mais tarde é que se foi
introduzindo a ideia de que deveria haver uma proteção, pelo menos,
para os danos provenientes de um evento súbido ou acidental (claro
que é legítimo questionar se só esta proteção em termos de
seguro é suficiente, uma vez que também podem existir danos
provenientes de processos de poluição gradual, como vimos).
À partida, parece estar definitivamente excluída do âmbito do
seguro aquela poluição típica decorrente do normal funcionamento
das instalações, isto porque é praticamente impossível eliminar
todo o tipo de emissões delas provenientes, até porque a função
do seguro é a de cobrir acontecimentos fortuitos e não certos.
Assim sendo, a poluição normal e inevitável proveniente de uma
certa atividade, é, em princípio, insegurável.
Em outros países, a cobertura para o risco de poluição encontra-se
limitada apenas a acidentes ou descargas repentinas, remetendo então
para o tipo de poluição súbita ou inesperada de que falámos
acima, sendo portanto de excluir do âmbito das suas apólices os
danos causados por acumulações graduais (apesar de alguns países,
como Itália, França, Alemanha, EUA ou Suécia, cobrirem este último
tipo embora com variantes e condições mais ou menos abrangentes).
Devido a esta restrição operada pelas seguradoras quanto ao tipo de
poluição que cobrem, muitas vezes tem se ido um pouco longe demais
lá fora, especialmente nos países anglo-saxónicos, quanto à
interpretação a dar às cláusulas do contrato de seguro,
interpretação essa que não tinha sido equacionada aquando da sua
elaboração. A título de curiosidade, por exemplo, tem se entendido
nos tribunais americanos a equivalência entre as expressões
“sudden” e “unexpected”, o que leva a que, mesmo em relação
a danos graduais (que não estavam cobertos pela apólice), desde que
se sustente que a sua manifestação ou perceção foi súbita,
então, mesmo as suas consequências sendo graduais, estariam
cobertas pelas apólices. É de louvar o esforço, mas parece-me que
talvez seja ir um pouco longe demais na extensão dos conceitos,
parecendo que se quer procurar, a qualquer custo, um culpado.
Para além deste problema do tipo de poluição e dos danos causados
abrangidos pela apólice de seguro, também nos podemos questionar se
as apólices abrangem só sinistros ocorridos durante a sua vigência.
É que, muitas vezes, pode dar-se o caso de ser difícil determinar o
exato momento da ocorrência do acidente, especialmente em casos de
contaminações de origem antiga (“contaminações históricas”)
que só se revelam mais tarde ou resultantes de causas
cientificamente ainda desconhecidas... Se é fácil partirmos logo
para a defesa do ambiente, também devemos equacionar o lado das
seguradoras: como é que podem calcular o montante das provisões a
constituir para fazer face a sinistros se a causa potencial ainda é
ignorada pela ciência? Como mensurar financeiramente os seus
efeitos?
Uma coisa é certa, é de excluir também o caso das contaminações
históricas das apólices porque não faz muito sentido cobrir danos
do passado em relação aos quais é difícil ou até impossível
identificar quem foi o responsável pelos mesmos.
Outra questão que também se pode colocar é a de saber se podemos
responsabilizar um empresário ou produtor diligente que cumpre todas
as normas e regulamentações impostas num dado momento e que,
posteriormente, podendo até ser fruto dos avanços científicos e
tecnlógicos, se descobrem daí derivados danos imprevisíveis. É
verdade que temos de ter em consideração quais eram os meios
técnicos e científicos disponíveis nessa altura, contudo também
temos de ter em atenção que, cada vez mais, o domínio ambiental
torna-se um campo fértil para a chamada responsabilidade objetiva: é
que por força de praticar certas atividades perigosas ou de impacto
ambiental forte, a responsabilização pode continuar a ter ligar,
independentemente do cumprimento normativo.
É à luz desta ideia de “risco” presente em certas atividades,
sobretudo na área ambiental, que acabam por ter consequências ao
nível da contaminação e dos danos ambientais, que surgem os
seguros obrigatórios. De facto, certas atividades profissionais
representam um risco implícito para terceiros e para o meio ambiente
e, por esse motivo, devem ser garantidas por um seguro de
responsabilidade civil ou então uma qualquer garantia financeira que
confira a possibilidade de um ressarcimento rápido e eficaz do dano.
São exemplos de seguros obrigatórios os seguintes normativos:
- Decreto-Lei 296/95, art. 6º referente a transferência de
resíduos;
- Decreto-Lei 3/2004, art. 62º;
- DL 69/2003, artigo 5º que remete para a portaria 1235/2003
(alterada pela portaria 1058/2004) – artigos 3º e especialmente
artigo 9º, que estabelece as exclusões quanto à abrangência do
seguro.
No entanto, sem querer entrar em considerações excessivas sobre o
assunto, gostava apenas de referir que, da perspetiva das
seguradoras, esta questão da existência de um seguro obrigatório é
mal encarada. Utilizam vários argumentos especialmente dizendo que se
trata de um instrumento ineficaz devido à sua pouca aceitação, os
riscos são variados devido à diversidade de atividades industriais
e serviços que podem produzir danos e que, por isso, não há
homogeneidade no estabelecimento de parâmetros de cobertura
adequados e uniformes, não cabe às seguradoras controlar o
cumprimento de normas ambientais mas sim ao Estado, o próprio
mercado encarrega-se de desenvolver técnicas mais criativas e
adequadas, porque livres e criadas pelas próprias partes, etc.
Não é alheio também o facto de questões de danos ambientais
provocarem grande reação na opinião pública, devido à crescente
valorização das questões ambientais e da sua divulgação. Ora,
tudo isto pode vir a ter reflexos nos valores das indemnizações, o
que pode explicar também a posição desfavorável das seguradoras
quanto ao seguro obrigatório.
No meu entender, é verdade que é ao Estado que incumbe a principal
fatia de prevenção e proteção do ambiente, tentando eliminar
potenciais riscos ambientais. Às seguradoras não cabe eliminar
esses riscos, pois eles não estão dependentes da sua ação
enquanto tal. Cabe isso sim transferir eventuais custos que coubessem
às instalações responsáveis pelos danos e essa transferência
pode trazer benefícios ambientais. É que, passando este risco para
as seguradoras, estas terão de desenvolver uma atividade de
prevenção e de fiscalização de forma a evitar que se produzam
danos – o que vai beneficar o meio ambiente. Além do mais, para
além desta função de “incitação à prevenção”, as
seguradoras são também as garantes face a danos ambientais.
Pelos exemplos dados em relação ao seguro obrigatório,
especialmente o último exemplo, conclui-se que há uma tendência de
implementação do mesmo quanto a atividades potencialmente
perigosas, só que sofre de alguma ineficácia. É que se por um lado
obriga à existência do seguro, por outro esvazia o seu conteúdo
útil através das várias exclusões (artigo 9º da portaria
1235/2003) que faz. Vemos a vantagem da existência de seguros
obrigatórios no sentido de incrementar e fortalecer cada vez mais a
consciência de proteção ambiental, no entanto as exceções não
podem ter maior abrangência do que a regra... Finalmente, em jeito
de conclusão, também nos devemos perguntar se toda a
responsabilização de um dano recai só sobre as seguradoras...
Afinal importa só intervir na reparação do dano, ou, pelo
contrário, evitá-lo em primeiro lugar?
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