domingo, 13 de maio de 2012


A Tutela Penal e Contra-Ordenacional do Ambiente

De acordo com a afirmação de Vasco Pereira da Silva em Verde Cor de Direito, o surgimento do Direito Sancionatório do Ambiente é, entre nós, um fenómeno muito recente. O Direito Sancionatório do Ambiente consiste numa reacção punitiva da ordem jurídica contra agressões ambientais. O Direito Penal do Ambiente e o Direito Contra-Ordenacional do Ambiente (sanções administrativas no domínio ambiental) equacionam diversas questões, entre as quais:

-É possível criminalizar condutas lesivas do ambiente e é admissível a existência de um Direito Penal do Ambiente? Quais os fundamentos?

-Será viável, o Direito Penal do Ambiente? Será o meio mais eficaz para reagir contra agressões ambientais?

A resposta à primeira questão só se encontra fazendo referência à própria natureza do Direito Penal. O direito penal português assenta uma perspectiva preventiva (de acordo com a finalidade das penas). Ao criar-se um novo tipo de crime, poder-se-á questionar se esta via será a mais adequada às exigências de resposta que o Direito do Ambiente encerra em si mesmo (especialmente se tivermos em conta que alguns dos princípios basilares do Direito Penal são o Princípio da Necessidade da pena, o Princípio da Proporcionalidade e o Princípio da Subsidiariedade). Se a via penal demonstra ser a mais eficaz e a mais adequada em contraposição à via administrativa.

No entanto, se aceitarmos como condição de partida que o direito ao ambiente é um direito fundamental (na opinião do Professor Vasco Pereira da Silva, é) e que este direito assumiu a dimensão de um bem jurídico objectivo fundamental, integrando os valores essenciais comuns da sociedade, concretizando as exigências da realização da dignidade humana e consubstanciando uma tarefa fundamental do Estado – então faz sentido a atribuição de dignidade penal ao bem jurídico ambiente. Sustentam esta posição, diversos argumentos, nomeadamente: a intensificação que a tutela penal ambiental daria ao Ambiente, partindo do pressuposto que, simbolicamente, é conferida uma maior dignidade jurídica (aqui, a dignidade jurídico-penal) ao associarmos a defesa do ambiente ao direito penal e ao facto de as garantias do direito penal passarem a estar presentes permitindo por um lado aplicação de sanções mais severas mas igualmente todas as garantias de defesa típicas do Direito Penal (ex: arts. 18º, 29º, 32º da CRP).


Do lado dos defensores de uma tutela contra ordenacional do ambiente a partir da realização pela via administrativa, apontam-se diversos argumentos, entre os quais: a celeridade e a eficácia (na punição do infractor ambiental que decorre da simplicidade do processo administrativo e que permite a prontidão da resposta punitiva ao delito cometido) e o facto de, ao contrário da imputação individual característica do direito penal, a tutela pela via administrativa permitiria a imputação individual e também a imputação e consequente responsabilização de pessoas colectivas.

Parece, no entanto, que a via mais indicada para a tutela sancionatória do ambiente não dispensa a criminalização de condutas altamente lesivas ao meio ambiente (sob pena de se deixar no agente um certo sentimento de impunidade e de, de certa forma, se deixar defraudar a ideia de que a tutela do ambiente consiste numa tarefa fundamental do Estado e é um valor fundamental que alicerça a sociedade em que vivemos). Não devemos não entanto entrar numa banalização do Direito Penal do Ambiente, até porque parece óbvio que muitos delitos ambientais encontrar-se-ão tutelados pelas sanções administrativas ou contra-ordenacionais. Na tipificação de crimes ambientais, é sempre necessária cautela e respeitar por um lado as necessidades de tutela do ambiente mas, por outro, os princípios integrantes do Direito Penal já oportunamente mencionados.

No Direito Penal português existem crimes ambientais, tipificados no Código Penal e bem assim diversas sanções administrativas, as quais constam em diversas leis reguladoras das formas de actuação ambiental ou dos componentes ambientais naturais, na modalidade de contra ordenações, que seguem o regime do ilícito de mera ordenação social (constante da Lei nº 109/2001 de 24 de Dezembro). O Código Penal português ocupa-se dos crimes ambientais nos arts. 272º e seguintes , trata-se de crimes em que está em causa uma conduta humana eticamente reprovável e que se traduz no incumprimento de uma disposição legal ou regulamentar, da qual resulta a lesão de um bem ambiental ( crime de resultado ou de dano).

É nos crimes dos arts. 278º, 279º e 280º do Código Penal que é mais premente uma certa acessoriedade administrativa do Direito Penal do Ambiente, contudo, tal não deve significar a substituição dos critérios individualizados da culpa ou da imputação subjectiva da conduta criminal a um dado indivíduo, por critérios objectivos de verificação da simples desobediência às disposições administrativas; dever-se-á, porquanto, conjugar ambas as dimensões para que se esteja perante um crime de carácter ecológico.


Em jeito de conclusão, a solução do ordenamento jurídico português, ao conjugar a tutela penal com a contra-ordenacional do ambiente (com preferência pela segunda), permite um afastamento (conveniente) de modelos exclusivistas, criando uma reacção sancionatória plena, adequada e efectiva.

Bibliografia:
- Dias, J.F. (1978). Sobre o papel do Direito Penal na Protecção do Ambiente. Revista de Direito e Economia nº 1
-Mendes, P. S. (2000). Vale a pena o Direito Penal do Ambiente. Lisboa: AAFDL
-Silva, V.P. (2002). Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina

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